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sábado, 11 de janeiro de 2014

15 filmes que são diamantes para o cérebro

CAPA

15 filmes que são diamantes para o cérebro


Recentemente, o jornalista Euler de França Belém, ao elaborar uma lista com sugestões de livros para o Natal, defendeu a tese de que bons livros são, na verdade, “diamantes para o cérebro”. Acredito que essa premissa — com a qual concordo inteiramente — possa ser estendida também para o cinema. Talvez com muito mais razão para o cinema, forma de expressão que, posto que goze de amplo apelo popular, tem perdido progressivamente a pretensão do “fazer artístico”, a privilegiar-se a lógica da produção em escala industrial de blockbusters. Com isso, cada vez mais temos cinéfilos autodeclarados que desprezam a leitura da Pauline Kael (às vezes, nunca ouviram falar dela), mas não hesitam em cultuar bobagens infantis. O resultado é o declínio da inteligência do público que, perdido no meio de tantas referências esparsas, ou simplesmente influenciado por críticos de cinema de pouca credibilidade intelectual, passa a absolver a pobreza narrativa fílmica, entretido com efeitos especiais mirabolantes, muitos dos quais a causar uma sutil, porém agressiva, paralisia cerebral.
Essa introdução serve para justificar a presente lista. Trata-se de uma tentativa de orientar o leitor da Bula — por certo, alguém que preza pelo que há de mais refinado no campo da cultura — no mar de referências cinematográficas. Como sói acontecer, a lista é estritamente pessoal: ela elenca obras que agradam ao meu gosto estético na arte cinematográfica. Basta pensar que, tivesse outro autor assinado a lista, as referências decerto mudariam (talvez ele viesse a público afirmar que “Curtindo a Vida Adoidado”, do diretor John Hughes, é superior aos filmes do Godard, opinião que eu nunca endossaria). A lista também é limitada: são apenas 15 filmes, o que incontornavelmente deixará de fora muitas obras relevantes (inclusive procurei misturar obras canônicas, sempre referidas, a outras mais atuais, como sugestões incomuns ao leitor da Bula). O que importa é que são quinze bons filmes que, da mesma maneira que os bons livros, podem muito bem servir como generosos diamantes para o cérebro.

A Felicidade Não se Compra, de Frank Capra

A Felicidade Não se Compra
O mais belo filme de Natal de todos os tempos. Essa é uma definição perfeita para “A Felicidade Não se Compra”. Mas o filme de Capra vai além. Filmado em 1946, é um retrato do apogeu estilístico da “Era de Ouro” de Hollywood, quando os filmes eram feitos para enaltecer as qualidades morais do indivíduo, além de elevar a autoestima da população. A fábula da cidade de Bedford Falls, do homem que é visitado por um anjo ao bater as portas do suicídio, é um daqueles casos raros em que um filme é capaz de salvar vidas.

Era Uma Vez em Tóquio, de Yasujiro Ozu

Era Uma Vez em Tóquio
Filme que assinala a maturidade artística de um dos maiores cineastas do século 20, o japonês Yasujiro Ozu. Com sua câmera parada, Ozu tinha a pretensão de captar a vida em sua fluidez natural. Nascia a estética do anticinema, oposição à grandiloquência hollywoodiana. O resultado é um filme lento (talvez o mais lento da história), a contar a saga do casal de idosos que viaja a Tóquio para rever seus filhos. E é exatamente esse compromisso inarredável com os detalhes que torna tão importante resgatar o cinema de Ozu: como estamos a viver na era da modernidade líquida (BAUMAN), no bojo da qual a velocidade fragiliza os laços humanos, a lentidão narrativa de “Era Uma Vez em Tóquio” contraria o porvir, a configurar-se num invulgar ato de resistência do artista (que enfrenta as pressões estéticas do seu tempo) e do público (que assim demonstra seu amor à potencialidade narrativa do cinema).

A Fraternidade é Vermelha, de Krzysztof Kieslowski

A Fraternidade é Vermelha
O problema com trilogias fílmicas é o risco que o diretor corre de não conseguir sustentar um padrão elevado de qualidade em todas as películas (vide o exemplo de Francis Ford Coppola, que, após dirigir com brilhantismo as duas primeiras partes de “O Poderoso Chefão”, falhou miseravelmente ao encerrar a saga da família Corleone). O polonês Krzysztof Kieslowski, felizmente, evitou esse risco. Sua ambiciosa Trilogia das Cores já tinha produzido dois filmes exitosos (“A Liberdade é Azul” e “A Igualdade é Branca”) quando veio à lume “A Fraternidade é Vermelha”, de 1994. De fato, Kieslowski reservou o melhor de sua trilogia inspirada nas cores da bandeira francesa para o capítulo final. Ao narrar história do juiz aposentado que espiona seus vizinhos, o diretor posiciona a bela Valentine como epicentro da compaixão fraternal que se pode transmudar no amor contrito — o único capaz de redimir a solidão e a tristeza de toda uma vida.

Cidadão Kane, de Orson Welles

Cidadão Kane
Este é um caso curioso de um filme que me parece prejudicado pelo prestígio que alcançou merecidamente junto à crítica. Incensado como “o melhor filme de todos os tempos”, enriquecido com centenas de teses acerca da correta interpretação do “Rosebud”, admirado pela técnica do diretor, empregada na condução de uma narrativa complexa, muita vez falta quem diga que a história do magnata que constrói um império jornalístico e tenta ingressar na vida política é bastante atual, especialmente no Brasil, que é pródigo em formar seus “Cidadãos Kane”. A diferença é que por aqui a vida pessoal desses magnatas não costuma ser infeliz como a de Charles Foster Kane. O “Cidadão Kane” brasileiro não tem escrúpulos.

Close-up, de Abbas Kiarostami

Close-up
O Irã é um país muito conhecido dos brasileiros pela polêmica política externa que adota. É uma pena que se resuma a isso. A milenar cultura persa, de que o povo iraniano é herdeiro, é riquíssima. Tão rica quanto o cinema que se faz por lá. “Close-up”, filme de 1990 do diretor Abbas Kiarostami, é um exemplo primoroso disso. A história de Sabzian, um homem tão apaixonado por cinema que forja a própria identidade autoral para enganar uma família, entrelaça documentário e ficção de maneira brilhante, a permitir uma salutar reflexão quanto aos limites da impostura (na vida como na arte cinematográfica).

A Separação, de Asghar Farhadi

separacao
Outra pérola recente do cinema iraniano. Um filme de 2011 que põe o dedo na ferida das tradições familiares de um país de moral teocrática rígida. O processo de divórcio do casal Nader e Simin serve como pretexto para atualizar a discussão em torno da fragilidade dos laços humanos num mundo de instituições anacrônicas. Decisões dramáticas, em princípio de consequências unilaterais, reverberam em estereotipagens consagradas (o papel da mulher na família) e na vida de terceiros, a causar o desfazimento não só da relação conjugal, mas a separação de muitos outros valores.

Casablanca, de Michael Curtiz

Casablanca
A história de encontros e reencontros da vida retratada com uma beleza poética indescritível. Um amor genuíno, que a guerra separou em Paris, tem a chance de acertar as contas em Casablanca (Marrocos). Rick, o insensível proprietário do bar, defronta-se com a amargura do amor perdido, que torna a assombrá-lo com a volta de Ilsa, que ele descobre casada com Victor Laszlo, o líder da resistência que planeja escapar à perseguição nazista. Estaria Rick disposto a ajudar Laszlo, mesmo que isso acarretasse a perda do amor de sua vida? É o tipo de pergunta que só pode ser respondida em “Casablanca” ao som de “As Time Goes By”.

No Tempo das Diligências, de John Ford

No Tempo das Diligências
John Ford eternizou-se em 1956 com “Rastros de Ódio”, sua obra-prima, presença constante na lista dos melhores filmes de todos os tempos. Mas o diretor dos filmes de faroeste começou a dar mostras do seu talento bem antes. Com “No Tempo das Diligências”, de 1939, Ford funda os estereótipos que permeariam boa parte das narrativas ambientadas no Velho-Oeste a partir de então: o xerife impoluto, o banqueiro cainho, o bêbado inconveniente, o anti-herói sedento de vingança, o ataque dos índios às diligências, as belas mulheres que convém proteger (e esposar). Eis aí um elenco de personagens carismáticos que, uma vez reunidos numa diligência, terão de enfrentar os perigos da travessia enquanto aprendem a difícil arte da convivência humana.

Onde começa o inferno, de Howard Hawks

Onde Começa o Inferno
O título nacional pomposo (mas que eu adoro) ignora o quanto de humor Hawks inseriu no seu filme. Os estereótipos que “No tempo das Diligências” ajudou a fundar em 1939 apresentam-se já consolidados neste filme de 1959: o xerife Chance, seu ajudante alcoólatra Dude, o vaqueiro egoísta Colorado Ryan (que faz, quando em quando, o papel de anti-herói), a beldade Feathers. É um filme que mostra como as relações locais de poder podem subjugar a autoridade do Estado — tese figurada no grupelho, liderado pelo xerife, que tenta resistir heroicamente à invasão à delegacia comandada pelo poderoso rancheiro Nathan Burdette. A cena em que Colorado e Dude, sitiados na delegacia, principiam a cantar “My Rifle, My Pony and Me”, de Dean Martin, é tão cativante que dá vontade de pegar o violão e cantar junto!

Ladrões de Bicicleta, de Vittorio de Sica

Ladrões de Bicicleta,
Fortemente influenciado pelas consequências que a 2ª Guerra Mundial impôs à população italiana na década de 1940, o movimento neorrealista tem em “Ladrões de Bicicleta”, de 1948, um de seus exemplares mais bem realizados. O diretor Vittorio de Sica conduz a narrativa de maneira pungente. O desemprego assola o país arrasado pelo conflito bélico. Os homens saem à cata de trabalho, necessitados que estão em pôr comida na mesa de suas famílias. É nesse contexto pobríssimo que Ricci consegue, após muita dificuldade, um emprego. Sua função é colar cartazes nas ruas. Seu instrumento de trabalho é a bicicleta. Ricci se desfaz de toda sua parca economia. Compra uma bicicleta, mas ela é roubada. Desesperado, temente ao desemprego, Ricci parte com seu filho Bruno numa jornada incansável pelas ruas da cidade, a farejar o rastro do ladrão. Se falhar, sua pena (e a de sua família) é a miséria. “Ladrões de Bicicleta” é, sem dúvida, um dos filmes mais tristes de todos os tempos. Uma obra-prima.

8½, de Federico Fellini

8½
O que torna “8½” tão especial é a ousadia do seu diretor. Com esse filme, Fellini desconstrói os modelos narrativos lineares do cinema. Para desenvolver a trama derredor do cineasta Guido Anselmi, atormentado por uma crise criativa que obstaculiza suas ideias, impedindo-o de conceber novos filmes, o diretor italiano optou por criar uma atmosfera onírica, que a todo o momento leva o expectador a questionar se o que vê é sonho ou realidade (ou mesmo nenhum dos dois). É um filme de difícil compreensão por parte do público que se acostumou a pensar que uma história deve ter começo, meio e fim (ainda que alguns dos elementos estejam invertidos na urdidura narrativa). Em “8½”, tudo que há são metáforas visuais fantasmáticas que se misturam a lembranças oriundas duma mente atormentada por uma tríade de fracassos: o artístico, o moral (repressão religiosa) e o amoroso (as mulheres que não soube amar).

Drive, de Nicolas Winding Refn

Drive
“Drive”, do dinamarquês Nicolas Winding Refn, é um exemplo maravilhoso de como um blockbuster de ação, quando bem dirigido, pode atingir a excelência fílmica. A história do dublê de cinema que à noite trabalha como piloto de fuga, ajudando bandidos, impressiona pelas referências estéticas (fortemente inspirada nos filmes da década de 1980), pela fotografia (a cidade escura) e pelo ritmo da narrativa, que alterna lentidão e celeridade, delicadeza e violência extrema. A cena do beijo no elevador entre o motorista (o protagonista não tem nome) e Irene é de uma sensibilidade artística tão grande que vale mais que todas as comédias românticas já produzidas em Hollywood.

Deixa Ela Entrar, de Tomas Alfredson

Deixa Ela Entrar
A exploração do mito do vampiro numa perspectiva antivampiresca. Parece contraditório? Pois é, já que o suspense “Deixa Ela Entrar”, do sueco Tomas Alfredson, consegue se apropriar da figura estereotípica do vampiro (no caso, a vampira Eli) qual uma ponte para desenvolver uma trama psicologicamente violenta sobre o bullying e a solidão pubescente. Méritos do diretor, que, para criar um clima sombrio e atemorizante, não precisou socorrer-se do “terror de açougueiro”, despejando litros de sangue e violência gratuita, prática cretina que veio a vulgarizar-se na indústria. Experimente convidar a namorada para ver o filme, alegando tratar-se de spin-off europeu de “Crepúsculo”, e surpreenda-a com um lindo tratado psicológico sobre a crueldade e a solitude humanas.

Aguirre – a Cólera dos Deuses, de Werner Herzog

Aguirre – a Cólera dos Deuses
No século 16, conquistadores espanhóis partem numa expedição em busca do Eldorado. Mas a selva amazônica reserva-lhes muitos perigos além dos ataques dos nativos. O ambicioso Lope de Aguirre assume o comando e lidera o grupo numa incursão suicida em busca de ouro. Esse é o mote desta produção alemã, de 1972, de alta densidade psicológica. Seu diretor Werner Herzog prima pela abordagem da loucura, a filmar cenas lindas de uma natureza selvagem que aprofunda o isolamento e a angústia dos conquistadores, na medida em que os aproxima mais e mais da morte. Destaque para a atuação de Klaus Kinski. Sua personagem Aguirre quase não fala; toda sua demência é denunciada por uma postura corporal trôpega e um olhar insano como poucas vezes se viu no cinema. Coisa de gênio.

O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte

O Pagador de Promessas
O cinema brasileiro contemporâneo tem rendido muita porcaria (essas comédias escrachadas, que mais parecem telenovelas globais com uma hora e meia de duração, são vergonhosas), mas muita coisa boa também (“Lavoura Arcaica”, de Luiz Fernando Carvalho, “Cidade de Deus”, de Fernando Meirelles, “O Som ao Redor”, de Kleber Mendonça Filho, e as duas partes de “Tropa de Elite”, de José Padilha, são ótimos exemplos de cinema nacional de qualidade). Apesar disso, faço gosto em citar “O Pagador de Promessas”, de 1962. Eis aí um filme mais lembrado pela premiação que levou (a Palma de Ouro em Cannes) que propriamente assistido. Na verdade, a película de Anselmo Duarte, que narra a jornada do Zé do Burro, o campônio que atravessa o sertão baiano a carregar a cruz redentora de sua promessa, é uma bonita representação da riqueza cultural brasileira, sem descuidar da crítica mordaz à burocracia eclesiástica que corrói a fé ao erguer muros discriminatórios e excludentes dos devotos.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A Inteligência Corporal Cinestésica na prática


"As inteligências dormem. Inúteis são todas as tentativas de acordá-las
por meio da força e das ameaças. As inteligências só entendem os
argumentos do desejo: elas são ferramentas e brinquedos do desejo".

Rubens Alves, em Cenas da Vida.


Danny MacAskill's Imaginate



Garrincha - The King of Dribble




KELLY SLATER 11X ASP WORLD SURFING CHAM




Singin' in the Rain - Moses supposes.wmv


"Cantando na Chuva - Filme"
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Trecho extraído do artigo - INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS

de Luiz Carlos Panisset Travassos

Graduado em Ciências Biológicas pelas FAMIH, professor de Ciências e Biologia para o ensino fundamental - Professor de Citologia das Faculdades Metodistas Integradas Izabela Hendrix - Mestrando em Engenharia da Produção da UFSC com ênfase em Informática Aplicada à Educação.

Fonte: http://eduep.uepb.edu.br/rbct/sumarios/pdf/inteligencias_multiplas.pdf

SOBRE A TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS, DE GARDNER

Leandro Kruszielski
Trabalho apresentado à disciplina de Psicologia da Aprendizagem,
da Universidade Federal do Paraná (1999)


Existem teorias científicas que revolucionam o modo de pensar de determinada área do conhecimento. Outras ganham espaço na mídia em geral e, consequentemente, são reconhecidas pelo grande público. A teoria das Inteligências Múltiplas de Howard Gardner parece estar enquadrada nos dois casos.

Este fato acarreta vantagens e desvantagens. A grande vantagem, neste caso, é a mudança de pensamento de pessoas que normalmente não tem acesso ou interesse em artigos científicos. A desvantagem encontra-se no fato de que, ao tornar-se uma teoria "popular", correria riscos de ser tratada superficialmente permitindo que os eventuais erros fossem expostos sem uma análise mais crítica.

Pensando desta maneira, o presente trabalho pretende apresentar de forma sucinta a teoria das Inteligências Múltiplas e realizar uma breve análise crítica da teoria, enfocando principalmente o aspecto neuropsicológico inserido nela. Por esta razão, durante a exposição da teoria em si, embora mantendo fidelidade ao conteúdo original, serão utilizados outros autores para fundamentar as inteligências em seu aspecto cerebral. Fundamentando-se assim, poderá acontecer uma crítica mais consistente por estar enfocada em determinado aspecto, que anteriormente foi destacado na apresentação da teoria.

2. A TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS

Em 1900 o psicólogo francês Alfred Binet foi solicitado para que desenvolvesse uma medida de predição do sucesso escolar de crianças das primeiras séries. Desta forma surgiu o primeiro teste de inteligência. Tal teste tinha por finalidade geral diferenciar crianças retardadas e crianças normais nos mais diferentes graus. Após a I Guerra Mundial, onde o teste de Q.I. (Quociente Intelectual) foi utilizado para medir a inteligência dos soldados, tornou-se muito popular sua aplicação.

Com a popularização do teste, propagou-se a idéia de inteligência nele inserida. A inteligência seria única, estagnada, passível de ser medida quantitativamente. Segundo GARDNER (1995, p. 21), autor da teoria das Inteligências Múltiplas que veremos a seguir, segundo esta visão tradicional: "a inteligência é (...) a capacidade de responder a itens em testes de inteligência". Os testes psicométricos consideram que existe uma inteligência geral, nos quais os seres humanos diferem uns dos outros, que é denominada g. Este g pode ser medido através da análise estatística dos resultados dos testes. É importante acrescentar que tal maneira de encarar a inteligência ainda hoje está presente no senso comum e mesmo em muitas parcelas do meio científico.

Porém podemos observar que durante todo o século XX, vários psicólogos e cientistas de outras áreas do conhecimento fizeram fortes críticas aos testes de Q.I. Vygotsky, por exemplo, apontou o erro no que diz respeito aos testes de inteligência abordarem as zonas de desenvolvimento proximal de modo errado. Piaget trabalhava com tais testes, mas a sua atenção era voltada para as linhas de raciocínio das crianças, não para as respostas dadas. Estudando as respostas erradas e os raciocínios que conduziam a elas, Piaget construiu parte de sua teoria. Ao criticarem o modo como era medido a inteligência, o próprio conceito de inteligência contido em tais testes era também criticado.

Entretanto uma proposta mais revolucionária surgiu recentemente através de Howard Gardner (foto), psicólogo e professor norte americano. GARDNER (1995, p.14) entende por inteligência "a capacidade para resolver problemas ou elaborar produtos que sejam valorizados em um ou mais ambientes culturais ou comunitários". A novidade dentro da teoria de Gardner é considerar a inteligência como possuindo várias facetas. Tais facetas, que na verdade são talentos, capacidades e habilidades mentais; são chamadas de inteligências na teoria das Inteligências Múltiplas, como o próprio nome explicita.

Antes de discorrer a respeito da teoria e das diversas inteligências vale lembrar de um curioso incidente que aconteceu em nosso país antes de Copa do Mundo de 1958. O Brasil possuía seu primeiro psicólogo esportivo, João Carvalhaes, que atendia a seleção brasileira de futebol. O psicólogo resolveu aplicar em todos os jogadores testes de QI. Garrincha, que estava no apogeu de sua carreira, após responder os testes ficou sabendo que seu quociente intelectual era irrisório, sendo classificado como débil mental. Por este motivo quase foi impedido de participar da Copa. (MODERNELL, 1992, p. 56)

Ninguém duvida do talento que possuía este atleta quando se encontrava no meio de um gramado com a bola nos pés. Todavia, o teste psicométrico de inteligência indicava Garricha como uma pessoa sem grandes chances de ser bem sucedido em sua vida, o que não correspondeu à realidade. Fica claro que os testes de QI predizem apenas como vai ser o desempenho escolar e não o sucesso profissional depois de concluída a instrução formal.

É dentro desta perspectiva que Gardner apresenta a teoria das Inteligências Múltiplas (IM). Os testes de QI medem apenas as capacidades lógica e lingüística, capacidades que normalmente são as únicas exigidas e avaliadas pelas escolas e, sem dúvida, as capacidades mais valorizadas em nossa sociedade. Gardner pretende considerar também as outras capacidades, as outras "inteligências" menos lembradas, para analisá-las em sua teoria.

Para selecionar quais as inteligências que seriam trabalhadas em sua teoria foram utilizadas diversas fontes: as informações disponíveis sobre o desenvolvimento normal e o desenvolvimento do indivíduo talentoso; estudos sobre populações prodígios, idiotas sábios, crianças autistas, crianças com dificuldade de aprendizagem; dados sobre a evolução da cognição; considerações culturais comparadas sobre a cognição; estudos psicométricos; estudos de treinamento psicológico e principalmente análise da perda das capacidades cognitivas nas condições de lesão cerebral. Foram consideradas inteligências genuínas apenas as inteligências candidatas que satisfaziam todos ou, pelo menos, a maioria dos critérios acima. Além disso cada inteligência deveria ter uma operação nuclear ou um conjunto de operações identificáveis e deveria também ser capaz de ser codificada em um sistema de símbolos. (GARDNER, 1995, p. 21-22)

Deste modo, foram selecionadas sete inteligências em particular: lógico-matemática, lingüística, musical, corporal-cinestésica, espacial, interpessoal e intrapessoal. Cada uma delas será analisada separadamente.

2.1 INTELIGÊNCIA LÓGICO-MATEMÁTICA

Como o próprio nome indica, a inteligência lógico-matemática é a capacidade lógica e matemática, assim como a capacidade de raciocínio científico ou indutivo, embora processos de pensamento dedutivo também estejam envolvidos. Esta inteligência envolve a capacidade de reconhecer padrões, de trabalhar com símbolos abstratos (como números e formas geométricas) assim como discernir relacionamentos ou então ver conexões entre peças separadas ou distintas. Relaciona-se, também, à capacidade de manejar habilmente longas cadeias de raciocínio, elaborar perguntas que ninguém fez, conceber problemas e levá-los a diante. Juntamente com a linguagem, é a principal base para os testes de QI. O desenvolvimento de tal inteligência foi o grande objeto de estudo de Jean Piaget.

Tal inteligência possui uma natureza não-verbal, de modo que a solução de um problema pode ser construída antes de ser articulada. Alguns idiotas sábios realizam grandes façanhas de cálculo sem sequer saberem comunicarem-se ou até mesmo realizar simples operações de adição ou subtração. Como dois gêmeos relatados por SACKS (1997, p.217) que apenas vêem a resposta do problema: "Uma data é mencionada e, quase instantaneamente, eles informam em que dia da semana ela cairá. (...) Eles também podem dizer a data da Páscoa durante o mesmo período de 80 mil anos." Enquanto tais gêmeos são tragicamente deficientes em diversas áreas, conseguiram realizar um algoritmo para a data da Páscoa que até mesmo o grande matemático Gauss teve uma enorme dificuldade para descobrir. Possuem uma inteligência lógico-matemática extremamente desenvolvida.

A região do córtex responsável pelo cálculo matemático em si e, provavelmente, pela inteligência lógico-matemática situa-se na região têmporo-paríeto-ocipital do hemisfério esquerdo. (LURIA, 1981, p. 25)

Está presente nos cientistas, programadores de computadores, contadores, advogados, banqueiros e matemáticos.

2.2 INTELIGÊNCIA LINGÜÍSTICA

A inteligência lingüística é manifestada no uso da linguagem (seja ela escrita, falada ou através de outro meio), no significado das palavras; pela capacidade de seguir regras gramaticais e usar a linguagem para convencer, estimular, transmitir informações ou simplesmente agradar. Ainda é responsável por todas as complexas possibilidades lingüísticas, entre elas, a poesia, as metáforas, o raciocínio abstrato e o pensamento simbólico.

São duas as principais áreas corticais responsáveis pela linguagem. A área de Wernicke (lobo temporal do hemisfério esquerdo) é responsável pelo entendimento da linguagem e a organização das palavras. A área de Broca (giro pós-central do hemisfério esquerdo) cuida da articulação da fala, da produção da linguagem expressiva. Ainda contribuem para a linguagem a região têmporo-ocipto-parietal responsável pela organização gramatical e o hemisfério direito para criar o ritmo, entonação e fluxo da fala. (SPRINGER; DEUTSCH, 1993. p. 184-186).

Nos poetas, teatrólogos, escritores, novelistas, oradores e comediantes podemos encontrar a inteligência lingüística bem desenvolvida.

2.3 INTELIGÊNCIA MUSICAL

Esta inteligência baseia-se no reconhecimento de padrões tonais (incluindo sons do ambiente) e numa sensibilidade para ritmos e batidas. Inclui também capacidades para o manuseio avançado de instrumentos musicais.

Não podemos separar para a inteligência musical determinadas áreas corticais como fizemos para a inteligência lingüística. Mas sabemos que o hemisfério direito, principalmente o lobo temporal, é o encarregado da audição e da criação musical. Uma lesão maciça neste hemisfério pode levar a uma amusia: o lesionado não consegue perceber combinações rítmicas ou até mesmo entonações de voz. (LURIA, 1981, p. 112)

É destaque dos músicos, cantores, compositores e maestros.

2.4 INTELIGÊNCIA CORPORAL-CINESTÉSICA

A inteligência corporal-cinestésica está relacionada com o movimento físico e com o conhecimento do corpo. É a habilidade de usar o corpo para expressar uma emoção (dança e linguagem corporal) ou praticar um esporte, por exemplo. Garrincha (foto), reprovado no teste de QI, provavelmente apresentaria um ótimo desempenho nesta inteligência se esta fosse submetida a um teste psicométrico.

"O controle do movimento corporal está, evidentemente, localizado no córtex motor, com cada hemisfério dominante ou controlador dos movimentos corporais no lado contra-lateral." (GARDNER, 1995, p. 23) Porém é possível acrescentar outras áreas corticais também importantes para a realização do movimento que Gardner deixa de lado. Uma delas é o giro pós-central, onde está localizado o Homúnculo de Penfield sensitivo. É uma representação somatotópica: cada ponto sensitivo do corpo tem uma representação nesta parte do córtex. Por exemplo, a mão, que possui muitos receptores sensitivos, possui uma representação grande no córtex enquanto que o pé, com menos receptores, possui uma área menor. (MACHADO, 1981, p. 219) Deste modo, esta área cortical tem como função sentir, perceber o corpo para que o movimento possa ser harmônico. Outra área importante é o córtex pré-motor, que integra os impulsos motores no tempo, permitindo a criação de movimentos habilidosos, suaves e finos. (LÚRIA, 1981, p. 154)

A inteligência corporal-cinestésica pode ser melhor observada em atores, atletas, mímicos, artistas circenses e dançarinos profissionais.

2.5 INTELIGÊNCIA ESPACIAL

A inteligência espacial é a capacidade de formar modelos mentais (imagens) e operar com tais imagens. A imagem não é necessariamente visual, pode ser construída uma imagem tátil, por exemplo, que é o que geralmente faz uma pessoa cega ao tatear objetos. Esta inteligência lida com atividades como as artes visuais, a navegação, a criação de mapas e a arquitetura.

Enquanto o hemisfério esquerdo do cérebro tornou-se mais lingüístico durante a evolução, o hemisfério direito especializou-se no processamento espacial. A principal área cortical que controle toda esta questão espacial é a região têmporo-paríeto-ocipital. Uma lesão em tal área impede que o lesionado consiga interpretar os ponteiros de um relógio, encontrar sua posição em um mapa ou então orientar-se dentro de espaços fechados. Fica claro o quanto esta a região têmporo-ocipto-parietal é importante para uma inteligência espacial. (LURIA, 1981, p.24)

Engenheiros, escultores, cirurgiões plásticos, artistas gráficos e arquitetos dependem desta inteligência para atuarem com êxito.

2.6 INTELIGÊNCIA INTERPESSOAL


Esta inteligência opera, primeiramente, baseada no relacionamento interpessoal e na comunicação. Envolve a habilidade de trabalhar cooperativamente com outros num grupo e a habilidade de comunicação verbal e não-verbal. Constrói a capacidade de perceber, por exemplo, alterações de humor, temperamento, motivações e intenções de outras pessoas. Em sua forma mais avançada a pessoa consegue ler, mesmo que os outros tentem esconder, os desejos e intenções, podendo ter empatia por suas sensações, medos e crenças.

"Todos os indícios na pesquisa do cérebro sugerem que os lobos frontais desempenham uma papel importante no conhecimento interpessoal. Um dano nessa área pode provocar profundas mudanças de personalidade, ao mesmo tempo em que não altera outras formas de resolução de problemas - a pessoa geralmente ‘não é a mesma' depois de um dano desses." (GARDNER, 1995, p.27)

A inteligência interpessoal é desenvolvida nos professores, terapeutas, políticos e líderes religiosos.

2.7 INTELIGÊNCIA INTRAPESSOAL

Esta outra inteligência pessoal está relacionada aos estados interiores do ser, à auto-reflexão, à metacognição (reflexão sobre o refletir) e à sensibilidade perante as realidades espirituais. Podemos dizer que é a capacidade de formar um conceito verídico sobre si mesmo pois envolve o conhecimento dos aspectos internos de cada um, como o conhecimento dos sentimentos, a intensidade das respostas emocionais, a auto-reflexão e um senso de intuição avançado.

"Assim como na inteligência interpessoal, os lobos frontais desempenham um papel central na mudança de personalidade. Um dano na área inferior dos lobos frontais provavelmente produzirá irritabilidade ou euforia, ao passo que um dano nas regiões mais altas provavelmente produzirá indiferença, desatenção, lentidão e apatia - um tipo de personalidade depressiva". (GARDNER, 1995, p. 28)

Um bom desempenho da inteligência intrapessoal pode ser encontrada em filósofos, conselheiros espirituais, psicólogos e pesquisadores de padrões de cognição.

Estas são as sete inteligências "clássicas" apresentadas no livro "Estruturas da Mente" de Gardner. O autor, posteriormente passou a considerar também outras inteligências conforme podemos observar em diversos artigos na internet. Uma delas é a inteligência naturalística, que é a capacidade do ser humano relacionar-se com a natureza. Outra inteligência "recente" é a pictórica ou pictográfica. Trata-se da habilidade para desenhar. Existe ainda a "inteligência" existencial que, na verdade, é considerada como uma meia inteligência por preencher apenas quatro dos oito requisitos avaliados para assegurar a existência da inteligência. Ela é responsável pela necessidade do homem fazer perguntas sobre si mesmo, sua origem e seu fim.

Uma das características das IM é a independência em grau significativo entre essas múltiplas faculdades humanas. Para explicar esta independência Gardner apoia-se no fato de que, em caso de lesão cerebral, determinadas capacidades são perdidas enquanto outras permanecem intactas. Desta forma, segundo o autor, as inteligências não interferem umas nas outras. (GARDNER, 1995, p. 29-30)
Contudo as inteligências agem de forma integrada. Um alto nível de capacidade na inteligência corporal-cinestésica apenas, por exemplo, não asseguraria a ninguém um sucesso como jogador de futebol. Seria necessário também um bom desenvolvimento da inteligência espacial para realizar bons passes e chutes a gol e também inteligência interpessoal desenvolvida para um bom relacionamento com os companheiros, os adversário e a imprensa. Estas três inteligências agindo de forma integrada provavelmente possibilitariam uma maior chance de sucesso no esporte. Todavia não seria necessário, neste caso, um bom desempenho da inteligência lógico-matemática, por exemplo, com bem demonstrou Garrincha.

Como era de se esperar, as inteligências possuem um desenvolvimento natural. Este inicia no início da vida com a capacidade de padronizar. Isto equivaleria a diferenciar tons na inteligência musical ou apreciar arranjos tridimensionais na inteligência espacial. O passo seguinte é a manifestação das inteligências em sistemas simbólicos: a linguagem nas frases, a música nas canções, a corporal-cinestésica na dança e assim por diante. A medida em que o desenvolvimento avança e surge um ambiente formal de educação, as inteligências passam a ser representadas em sistemas notacionais. São exemplos a matemática, a notação musical, os mapas e plantas e assim por diante. Finalmente o desenvolvimento atinge seu auge na expressão inteligente nas atividades profissionais e de passatempo na adolescência e adultez. As inteligências pessoais parecem não seguir este curso, surgindo muito mais gradualmente. (GARDNER, 1995, p. 31-32)

3. CRÍTICA À TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS

3.1 INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E NEUROPSICOLOGIA

Uma das fontes para a escolha das inteligências propostas acima foi o estudo de como tais capacidades falham sob condições de lesão cerebral. Isto pressupõe que cada inteligência possui uma localização cerebral, mais especificamente cortical. Assim sendo, uma lesão que incapacitaria determinada inteligência, deixaria as demais intactas. A tabela abaixo apresenta um resumo da representação cortical de todas as inteligências consoante vimos ao analisar cada inteligência em particular.

Tabela 1 - Localização cortical das inteligências múltiplas propostas por Gardner.

Inteligência
Área cortical responsável
Lógico-matemática
região têmporo-paríeto-ocipital
Lingüística
área de Wernicke, área de Broca,
região têmporo-paríeto-ocipital (hemisfério esquerdo)
Musical
Lobo temporal (hemisfério direito)
Corporal-cinestésica
Giro pós-central, córtex pré-motor
Espacial
região têmporo-paríeto-ocipital
Interpessoal
lobos frontais
Intrapessoal
lobos frontais
Podemos perceber através da tabela que diversas inteligências são regidas pela mesma área do córtex cerebral. A região têmporo-paríeto-ocipital é responsável ao mesmo tempo pelas inteligências lógico-matemática, lingüística e espacial. As inteligências pessoais também são comandadas por uma única área: os lobos frontais.

Isto invalida a independência das inteligências que Gardner propõe. Imaginemos uma lesão na região têmporo-paríeto-ocipital. Ela acabaria por afetar três inteligências ao mesmo tempo e não apenas uma.

Além disso, neste caso, os desenvolvimentos das inteligências lógico-matemática, lingüística e espacial não aconteceriam separadamente, mas seriam dependentes entre si. LURIA (1981, p. 24-25) desenvolve uma explicação destas áreas como sendo integradoras e essencialmente espaciais. Assim, tanto a matemática quanto a gramática seriam trabalhadas pelo cérebro de uma forma espacial. Uma deficiência espacial tornaria incapazes tarefas de relacionar "espacialmente" os números entre si e construir uma frase trabalhando as relações "espaciais" entre as palavras.

Não se trata das inteligências lógico-matemática e lingüística serem englobadas pela inteligência espacial, mas da aceitação de uma dependência e de uma relação íntima entre determinadas inteligências.

O mesmo ocorre com as inteligências pessoais. É possível perceber que em várias características tais capacidades equivalem-se. Afinal, uma mesma área cerebral é responsável pelas duas. Todo psicoterapeuta conhece e chega mesmo a ser lugar-comum o fato de que só podemos conhecer bem o outro se conhecermos bem a nós mesmos primeiro. Sendo assim uma inteligência interpessoal desenvolvida necessita de uma inteligência intrapessoal também bem trabalhada, o que sugere não existir uma independência entre as inteligências.

3.2 AS NOVAS INTELIGÊNCIAS

"Uma lista de 700 inteligências seria proibitiva para o teórico e inútil para o praticante. Consequentemente, a teoria das IM tenta articular apenas um número manejável de inteligências que parecem constituir tipos naturais". (GARDNER, 1995, p.45) Esta foi a resposta dada pelo autor da teoria das inteligências múltiplas quando perguntado o que impediria a construção de novas inteligências: elas poderiam deixar de ser 7 e tornarem-se 700!

Porém surge a impressão de que o próprio autor está caminhando contra o que afirmou ao apresentar as "novas" inteligências naturalística, pictórica e existencial. Tendo em vista as inúmeras capacidade humanas, por que a escolha arbitrária de algumas delas em detrimento de outras? Se o objetivo era tornar as inteligências manejáveis estando elas em número limitado de modo que o uso prático da teoria possuísse maior eficácia, a adoção de novas inteligências somente dificultaria este processo.

Se Gardner apresenta novas inteligências, nada impede que outras inteligências sejam descobertas - ou criadas - por outros autores. Isto é preocupante pois não parece ser tarefa muito árdua a criação de uma nova inteligência. Para demonstrar esta afirmação, apresento neste trabalho um esboço de uma nova inteligência: a inteligência palato-olfativa.

Podemos considerar tal inteligência como a capacidade de sentir o gosto e o cheiro das substâncias e identificá-las com precisão. Em nossa sociedade esta inteligência seria valorizada nos cozinheiros, enólogos e provadores nas empresas como cervejarias e torrefação e moagem de café. A fim de evidenciar a veracidade desta inteligência, seguirei os critérios para a escolha de um inteligência conforme foram descritos anteriormente.

Um dos critérios é a existência de estudos sobre populações excepcionais, incluindo prodígios. Nada melhor para a provar a existência de tais estudos do que o relato realizado por Oliver Sacks a respeito de um estudante de medicina que, por usar determinadas drogas (cocaína, cloridrato de fenociclidina [PCP] e anfetaminas), passou algumas semanas de sua vida com o olfato e o paladar extremamente aguçados. "Ele descobriu que podia distinguir todos os seus amigos - e pacientes - pelo cheiro. (...) Ele era capaz de cheirar as emoções - medo, alegria, sexualidade - como um cachorro. Podia reconhecer cada rua, cada loja pelo cheiro - era capaz de se deslocar por Nova York , infalivelmente, guiado pelo cheiro." (SACKS, 1997, p.176)

Outro critério é a informação sobre o colapso da inteligência em condição de lesão cerebral. A área responsável pelo olfato possui uma pequena representação cortical na parte anterior do uncus e do giro parahipocampal. Nos casos de epilepsia focal nesta área, o epilético queixa-se de cheiros, normalmente desagradáveis, que não existem. (MACHADO, 1981, p. 220) Uma lesão nesta área leva a uma anosmia, ou sejam incapacidade de sentir odores.
Para aceitar tal inteligência é preciso considerar também os dados sobre sua evolução. Sobre tal assunto, "Freud escreveu em várias ocasiões que o sentido do olfato no homem era uma ‘perda', reprimido no crescimento e na civilização quando o homem assumiu a postura ereta e reprimiu a sexualidade primitiva, pré-genital." (SACKS, 1997, p. 177) Nas obras de Freud tal idéia é encontrada principalmente nas cartas número 55 e 75. A adoção da postura ereta deixava o nariz mais longe do chão e fornecia um maior campo para a visão e para a audição. De fato, a representação do olfato e da gustação passaram a ocupar um lugar pronunciadamente menor no córtex por serem eclipsados pela representação central dos sistemas exteroceptivos superiores, principalmente a visão e a audição. (LURIA, 1981, p. 49)

Ainda devemos considerar o aspecto cultural da inteligência palato-olfativa, que para ser considerada como tal, precisa ser universal. Deste modo temos a culinária, presente em todas as culturas e em todas às épocas. Cada povo possui uma culinária própria onde cheiros e sabores são apreciados ou depreciados e a capacidade da preparação de alimentos crus, fritos ou cozidos é valorizada.

Da mesma maneira todos os outros critérios para a aceitação de uma inteligência - como o conhecimento do desenvolvimento desta inteligência, os estudos psicométricos e os estudos de treinamentos psicológicos - também podem ser encontrados e explicitados da forma como realizada acima.
E, trabalhando de igual modo, poderiam ser criadas tantas inteligências quanto o número de capacidades humanas existentes.

4. CONCLUSÃO

A teoria das Inteligências Múltiplas tem enorme importância ao conseguir derrubar a idéia de uma inteligência única, fechada. A muito a ciência estava impregnada com tal idéia e já era tempo de fazermos uso de uma noção de inteligência mais dinâmica.

Embora ninguém possa discordar das afirmações acima, também esta teoria tens seus erros. Talvez o grande erro seja, tendo em vista as inúmeras capacidades humanas valorizadas em nossa sociedade, escolher algumas ignorando, com efeito, as outras não mencionadas. Por outro lado considerar todas as inteligências seria impossível e inadequado.

Por isso Gardner escolheu um número limitado de determinadas inteligências e acreditou em uma independência entre elas. Tal comportamento foi exemplo típico do pensamento pragmatista americano. Deste modo as inteligências escolhidas poderiam ser trabalhadas de modo mais eficaz.

Porém poderíamos considerar também as inúmeras capacidades existentes em cada ser humano e, sem pretensão de desejar um desenvolvimento total, procurar desenvolver a inteligência em que cada pessoa em particular é mais apta, que não necessariamente precisa estar incluída nas dez inteligências descritas na teoria das IM. Desta forma, o educador - ou qualquer outro profissional que trabalharia com a inteligência- precisaria conhecer melhor cada indivíduo para perceber nele a capacidade que se sobressai. Os resultados provavelmente seriam melhores pois, conforme vimos, a independência pura entre as inteligências não existe e desenvolvendo melhor uma capacidade, outras também seriam afetadas.

Mas este seria um passo mais adiantado. Levando-se em conta a atual situação dos profissionais que, de qualquer forma, trabalham com o aprendizado, a simples adoção da teoria das IM já é mais do que satisfatório.

REFERÊNCIAS BIBILIOGRÁFICAS

GARDNER, Howard. Inteligências Múltiplas: a teoria na prática 1. ed. Porto Alegre :
Artes Médicas, 1995

LURIA , Aleksandr Romanovich. Fundamentos de Neuropsicologia. 1. ed. São Paulo:Editora da Universidade de São Paulo, Livros Técnicos e Científicos Editora, 1981.

MACHADO, Angelo. Neuroanatomia Funcional. 1. ed. São Paulo : Atheneu, 1981.
MODERNELL, Renato; GERALDES, Elen. O Enigma da Inteligência. Globo Ciência, Rio de Janeiro, v.2, n. 15, p.56-63, out. 1992

SACKS, Oliver. O homem que confundiu sua mulher com um chapéu. 1. ed. São Paulo :Companhia das Letras, 1997

SPRINGER, Sally P.; DEUTSCH, Georg. Cérebro Esquerdo, Cérebro Direito. 1. ed. SãoPaulo : Summus, 1993