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segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Google Retrospectiva 2012


O Google preparou uma retrospectiva do ano de 2012 em um filme intitulado Zeitgeist 2012. Em poucos minutos, foram relembrados todos os fatos marcantes do ano que está acabando. 

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sábado, 22 de dezembro de 2012

Direitos e Garantias Fundamentais: Uma análise sócio-antropológica do surgimento e implantação dos Direitos Humanos


DA PERCEPÇÃO E EVOLUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS


 Em sua breve história, a humanidade indubitavelmente tem feito grandes descobertas tecno-científicas e, durante o período da pós-modernidade, vem desenvolvendo um amplo e sofisticado sistema de reconhecimento sócio-antropológico decorrente dos debates filosóficos acerca da essência humana e sua relação proximal com o direito (iniciada com um caráter mais político na Antiguidade Clássica e posteriormente passando a tomar uma roupagem mais humanística quando da época do Iluminismo), perpassando desde questões mais elementares da política social até os mais complexos conceitos relativos à identidade social como noções de reconhecimento/pertencimento a um grupo social, características e processos de inclusão/exclusão em grupos sociais diversos, ocorridos com maior intensidade nas décadas finais do século XX sob a alçada dos conceitos-chave da psicologia social.
Com a influência dos princípios de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, invocados como temas nucleares assumidos nos aportes teóricos da Revolução Francesa, procurou-se observar a existência de direitos inerentes à essência da natureza humana e, por este fato, tendentes à universalidade, sendo assim inicialmente chamados de Direitos Naturais (posteriormente nomeados como Direitos Humanos) resultados de questionamentos filosóficos já iniciados muitos anos antes quando da Antiguidade Clássica. Esses direitos tiveram interpretações diversas de acordo com a época histórica e as concepções das doutrinas aplicadas ao direito. Sobre este assunto, versaremos em item seguinte.

DIREITOS HUMANOS E SUA OBSERVÂNCIA JUNTO ÀS DOUTRINAS JURÍDICAS


            Os Direitos Naturais encontraram-se presentes durante todo o desenvolvimento da história do homem conforme diferentes concepções fundamentadoras fomentadas na natureza da essência humana, constituindo-se como verdadeiros troncos jurígenos dos quais emanaram uma série de teorias que variavam ora entre teorias teológicas, teorias humanísticas, e teorias jurídicas positivadas iniciadas em Roma na expansão do Império e, na modernidade, pautadas no racionalismo de René Descartes e no positivismo proposto por Auguste Comte.
Por suas diferenças no que tange aos instrumentos metodológicos e às concepções filosóficas, acabaram sendo agrupadas conforme sua natureza axiológica em Jusnaturalismo e Juspositivismo.

Jusnaturalismo


            É a doutrina que considera o direito enquanto representação externa (expressão) das vontades e particularidades relativas à essência do homem, tomadas como fruto da razão humana ou a expressão da vontade de Deus, dos deuses ou de entidades espirituais, esta corrente não se detém ao exercício de direitos apenas como condutas regidas pela prescritividade legal, emanadas de um documento que formalize as práticas sociais.
Desta forma, o direito é tratado aqui na sua esfera primordialmente subjetiva, tomando uma formatação mais abrangente e, ao mesmo tempo, impessoal, de sorte que muitas vezes, objetivando resolver os litígios, observar-se-iam os ditames culturais e sócio-antropológicos concernentes aos mais experientes dentro de uma sociedade patriarcal ou aos representantes religiosos, com o argumento de que pelo fato de manterem contato a muito mais tempo na sociedade, era provável deterem conhecimento profundo dos elementos constitutivos de determinada sociedade e assim teriam discernimento o bastante para solucionar os litígios que por ocasião surgissem.

Juspositivismo


            Nesta corrente, os Direitos Naturais são tratados com um pouco mais de distanciamento axiológico, de tal forma que a normatização é critério objetivo que dá sentido, ou seja, a norma é condição sine qua non ao reconhecimento dos direitos fundamentais. Desta sorte, para essa doutrina, só é Direito Fundamental aquilo que a Norma Constitucional classifica como tal, tomando como necessidade básica a prescritividade dos atos normativos, a força emanada da norma para fazer valer os efeitos jurídicos decorrentes dos atos sociais.
            Intentando fazer uma análise histórica do direito enquanto tecnologia social, nota-se que a função regulatória é imensamente importante afinal, sua característica primordialmente protetora dos bens e valores socialmente reconhecidos enquanto merecedores de tutela estatal por terem importância basilar na constituição de um Estado e servirem de chaves interpretativas para uma sociedade, exerce, portanto, imensa importância na sociedade pois estruturam-se como parâmetros a ser seguidos por toda a coletividade. Com o surgimento da necessidade de instauração de um sistema escrito para difusão do Direito, percebeu-se que as diretrizes básicas, inicialmente contidas em reflexões meramente filosóficas e existenciais transmitidas através de uma tradição eminentemente oralista, deveriam também estar contidas nos documentos que norteariam o sistema jurídico que regularia os atos do Estado para com os particulares e as relações inter partis em cada sociedade de tal forma que estivessem prescritos atos lícitos e ilícitos, obrigações e sanções para os descumprimentos das normas (fossem sociais ou positivas) de forma implícita ou explícita.
Tomando como base a importância histórica do reconhecimento dos direitos fundamentais, percebe-se que quando da escritura da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, emanada do povo francês quando da Revolução Francesa, foram sendo introduzidos paulatinamente conceitos que se representaram a iniciação metódica de parâmetros jurídicos (pautados naquilo que se convencionou ter por características universais do ser humano) que, tendesse a alcançar a totalidade dos homens, sem a necessidade de fazer as devidas distinções em períodos históricos ou localização geográfica, sendo generalista, impondo de forma coercitiva uma noção latente de padronização e eminentemente impositiva quanto aos processos de admissão em searas sociais específicas.

INTRODUÇÃO
Direitos e Garantias Fundamentais são institutos jurídicos encontrados em todas as constituições da pós-modernidade, de forma implícita ou explícita, sob a égide de exercer tutela sobre bens e valores elementares que permitam a convivência harmônica entre os seres humanos. É possível dizer que Direitos Fundamentais são juízos de valor emanados sócio antropologicamente por sujeitos e/ou grupos sociais dominantes ou com vistas à uniformização de funções sociais e execução da práxis do poder.
Esses valores primordiais são produto de processos históricos e, por isso mesmo, são contingenciados, cumulativos, de sorte que os bens tutelados tendem apenas a se ampliar e nunca a reduzir. Em nossa constituição, em seu Título II, trata-se exclusivamente sobre Direitos e Garantias Fundamentais, contudo, nem todos os Direitos Fundamentais exprimem-se ali, por terem sido colocados em outros Títulos ou pelo simples fato de alguns deles não terem sido observados quando do processo de escrita da Carta Magna. Uma abordagem muito interessante acerca desses direitos é que muitos autores (inclusive a Norma Civil) defendem que existem alguns direitos natos, ou seja, o ser humano, pelo simples fato de ter nascido com vida, já carrega consigo uma série de direitos. Outra questão de impedimento à positivação dos Direitos Fundamentais é a pobreza lexical que impede a expressão conceitual em relação a questões extremamente abstratas no que tangem a esses direitos.
Garantias Fundamentais são institutos jurídicos de natureza procedimental que instrumentalizam e, de certa forma, asseguram o exercício dos Direitos Fundamentais. É mais uma forma de instigar o cumprimento dos direitos.
ORIGEM E EVOLUÇÃO
            Direitos Fundamentais nascem de uma perspectiva inicialmente ligada à noção de providência de Deus, dos deuses ou de entidades espirituais a certas necessidades do ser humano, ao passo que a incorporação dessa noção à realidade vigente, de certa forma, acabou tendo uma assunção de uma postura que garantia a proteção desses direitos por instrumentos de procedimentalização jurídica cunhados de garantias jurídicas fundamentais. Durante a história dos Direitos Fundamentais, seus objetos de incidência foram se modificando e, quanto a isso, podem ser classificados em quatro espécies ou gerações de acordo com a matriz objetiva que dava as diretrizes à criação dos direitos:
1.    Direitos de primeira geração: são também conhecidos como direitos da liberdade, de forma que, faz nascer a necessidade do exercício da prestação negativa do Estado, ou seja, o Estado não poderia cercear os direitos referentes à liberdade, cabendo apenas respeitar as liberdades individuais (normalmente tida com um caráter contratualista) dos sujeitos.
2.    Direitos de segunda geração: são também classificados direitos de igualdade, assegurados através de prestação positiva do Estado em reconhecer e estimular políticas públicas que procurem dar as mesmas condições a todos os partícipes, pondo-os na mesma possibilidade de ascensão social, evitando a manutenção das disparidades sociais e a redução do abismo socioeconômico.
3.    Direitos de terceira geração: esses direitos são agrupados como direitos que buscam englobar a segurança de terceiros, ou seja, os direitos ligados à fraternidade. Isso quer dizer, que o objetivo desses direitos é buscar assegurar a continuidade de um bem, resguardando a outros sujeitos uma série de direitos que, para haver continuidade, devem ser previamente preservados. São direitos sociais e, por isso, exigem prestação positiva do Estado com relação ao reconhecimento e implementação de políticas públicas que favoreçam o alcance da modalidade-fim à qual vem se propondo.
4.    Direitos de quarta geração: esses direitos foram difundidos depois dos acontecimentos históricos e socioeconômicos decorrentes da Segunda Guerra Mundial, e foram conhecidos como direitos da globalização, pois se estenderam a uma grande quantidade de países de forma quase igualitária, ressalvadas algumas características particulares de cada nação.
Há ainda autores que defendem uma quinta geração de direitos advinda dos avanços significativos nas áreas de robótica e biotecnologia.
DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO
            O direito à Educação está para além do direito de ser lotado numa sala de aula. Ter direito à educação é, na verdade, ter meios de dotar os aprendizes de condições mínimas de construção de uma identidade social e cultural proporcionando um desenvolvimento biopsicossocial aceitável, estimulando o exercício crítico e reflexivo e a empatia nos sujeitos. RAMOS (2007) relata que:
"O direito a educação é considerado um dos direitos fundamentais ao homem e ocupa mundialmente um lugar central nos Direitos Humanos. De acordo com o pensamento de André Ramos, tais direitos é um conjunto mínimo de normas "necessárias para assegurar a vida digna do ser humano" e, por isso, "são direitos atribuídos a qualquer indivíduo, sendo assim, considerados direitos de todos"."
Segundo CURY (2002), ao analisar o eminente jurista Norberto Bobbio quando da normatização de políticas relativas à educação:
"A existência de um direito, seja em sentido forte ou fraco, implica sempre a existência de um sistema normativo, onde por "existência" deve entender-se tanto o mero fator exterior de um direito histórico ou vigente quanto o reconhecimento de um conjunto de normas como guia da própria ação. A figura do direito tem como correlato a figura da obrigação. (1992, p. 79-80)
Certamente que, em muitos casos, a realização dessas expectativas e do próprio sentido expresso da lei entra em choque com as adversas condições sociais de funcionamento da sociedade em face dos estatutos de igualdade política por ela reconhecidos. É inegável também a dificuldade de, diante da desigualdade social, instaurar um regime em que a igualdade política aconteça no sentido de diminuir as discriminações. Além disso, muitos governos proclamam sua incapacidade administrativa de expansão da oferta perante a obrigação jurídica expressa."
Neste sentido, proponho o exercício crítico acerca de um tema absolutamente polêmico que ronda o cenário social: a política de cotas principalmente para o ensino superior.
A política de cotas constitui um dos instrumentos de tentativa de retroação ou amenização dos efeitos altamente gravosos causados por anos de desigualdades e exclusão social ao passo que traz em sua gênese teórica a razão social advinda da possibilidade de incluir socialmente (e não tentar apenas inserir) os sujeitos capazes de desenvolver-se biopsicossocialmente dentro dos interesses coletivos e particulares. Insere-se ai então uma imensa discussão doutrinária acerca do que me parece ser uma interpretação reducionista, tal a falta de uma observação hermeneuticamente criteriosa sobre o princípio constitucional conhecido por isonomia, ou seja, a diretriz que busca implantar a igualdade e o sentimento de equidade entre os partícipes. Assim, se faz necessário a citação do disposto no caput do artigo 5º, bem como os incisos IX, XIV da Constituição Federativa do Brasil:
"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...].
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;"
Se o direito à educação é assegurado entre os artigos 205 e 214 e o princípio da isonomia encontra-se expresso no artigo 5º da Carta Constitucional, parece, pois, repousar ai um conflito, uma dicotomia aparente: a política de cotas parece gerar um fenômeno inverso ao proposto pelo princípio da igualdade, pois, tal "concessão" atua de maneira que fere o princípio de concurso sem cláusulas especiais que resguardem grupos sociais específicos. Entretanto, em sua abordagem pedagógica, a política de cotas existe para instaurar a tentativa de incluir histórica, econômica e socialmente sujeitos pertencentes a searas sociais que, historicamente, vem sendo violentadas com a força centrípeta, altamente repressiva da padronização social, massificando a ideologia de uma maciça representação do poder coercitivo do Estado em relação aos indivíduos através de instituições como o direito.
Versando sobre a instituição das leis que tem como substrato material a educação, atuando tanto no cenário nacional (através da legislação constitucional e infra-constitucional) quanto por tratados internacionais de reconhecimento da importância desta ferramenta de enorme importância social, diz CURY (2002):
"É por essas razões que a importância da lei não é identificada e reconhecida como um instrumento linear ou mecânico de realização de direitos sociais. Ela acompanha o desenvolvimento contextuado da cidadania em todos os países. A sua importância nasce do caráter contraditório que a acompanha: nela sempre reside uma dimensão de luta. Luta por inscrições mais democráticas, por efetivações mais realistas, contra descaracterizações mutiladoras, por sonhos de justiça. Todo o avanço da educação escolar além do ensino primário foi fruto de lutas conduzidas por uma concepção democrática da sociedade em que se postula ou a igualdade de oportunidades ou mesmo a igualdade de condições sociais.
Hoje cresceu, enfim, a importância reconhecida da lei entre os educadores, porque, como cidadãos, eles se deram conta de que, apesar de tudo, ela é um instrumento viável de luta porque com ela podem-se criar condições mais propícias não só para a democratização da educação, mas também para a socialização de gerações mais iguais e menos injustas."
Analisando a inserção do direito à educação nas cartas constitucionais, BOBBIO (1992) diz:
"Não existe atualmente nenhuma carta de direitos que não reconheça o direito à instrução — crescente, de resto, de sociedade para sociedade — primeiro, elementar, depois secundária, e pouco a pouco, até mesmo, universitária. Não me consta que, nas mais conhecidas descrições do estado de natureza, esse direito fosse mencionado. A verdade é que esse direito não fora posto no estado de natureza porque não emergira na sociedade da época em que nasceram as doutrinas jusnaturalistas, quando as exigências fundamentais que partiam daquelas sociedades para chegarem aos poderosos da Terra eram principalmente exigências de liberdade em face das Igrejas e dos Estados, e não ainda de outros bens, como o da instrução, que somente uma sociedade mais evoluída econômica e socialmente poderia expressar."
Analisando o texto retrocitado, CURY complementa com o pensamento de OLIVEIRA:
"Apesar desse direito não constar do estado de natureza ou mesmo entre os chamados direitos naturais, será no contexto da aceitação ou da recusa a essa forma de encarar o nascimento da sociedade moderna que a instrução lentamente ganhará destaque. Ora ela é o caminho para que as Luzes (Universais) se acendam em cada indivíduo, a fim de que todos possam usufruir da igualdade de oportunidades e avançar diferencialmente em direção ao mérito, ora ela é uma função do Estado a fim de evitar que o direito individual não disciplinado venha a se tornar privilégio de poucos.
Com efeito, as luzes da razão, com suas leis racionais, supõem a atualização nos seres racionais de modo a poder realizar o interesse de todos em cada qual. A realização do interesse de cada um, interesse esse racional e oposto ao universo passional, é tido como um valor que impulsiona a ação do indivíduo tendo em vista o princípio da responsabilidade individual. De acordo com este princípio, cada pessoa, cada cidadão deveria ser capaz de garantir-se a si mesmo e a seus dependentes, não cabendo a intervenção do Estado (Oliveira, p. 160, 2000)."
Continuando a análise acerca do papel da educação na construção de um indivíduo capaz de executar satisfatoriamente a autogestão, CURY atesta:
"E uma das condições para o advento dessa "racionalidade iluminada" e interessada, própria da sociedade civil enquanto universo do privado, é a instrução, à medida que ela abre espaço para a garantia dos direitos subjetivos de cada um. E como nem sempre o indivíduo pode sistematizar esse impulso, como nem sempre ele é, desde logo, consciente desse valor, cabe a quem representa o interesse de todos, sem representar o interesse específico de ninguém, dar a oportunidade de acesso a esse valor que desenvolve e potencializa a razão individual. Mas, segundo John Locke, esta é uma possibilidade a ser construída.
...Locke adverte, o caminho que leva à construção desta sociedade implica um processo gigantesco de educação, e não apenas a educação entendida no sentido da transmissão do conhecimento mas no sentido da formação da cidadania. (Oliveira, p. 181, 2000)
Daí a instrução se tornar pública como função do Estado e, mais explicitamente, como dever do Estado, a fim de que, após o impulso interventor inicial, o indivíduo pudesse se autogovernar como ente dotado de liberdade e capaz de participar de uma sociedade de pessoas livres."
A Constituição Federal, promulgada em 1988 assegura, nos artigos 205 a 214, o direito à Educação, dentre os quais, destacamos:
"Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206- O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de qualidade.
VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.
[...]
Art. 207 - As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
[...]
Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a:
I - erradicação do analfabetismo;
II - universalização do atendimento escolar;
III - melhoria da qualidade do ensino;
IV - formação para o trabalho;
V - promoção humanística, científica e tecnológica do País.
VI - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto."
Antes de nos aprofundarmos na discussão, é preciso notar a necessidade de análise dos entornos que cerceiam a questão da educação, principalmente estimulando a análise ideológica contida nos discursos daqueles que defendem a teoria da isonomia absoluta em detrimento da política social das cotas para ingresso nas universidades.
Segundo MARTINS:
"Comecemos por entender o alcance da educação como direito de todos. A educação é a prerrogativa que todas as pessoas possuem de exigir do Estado a prática educativa. Como direito de todos, a educação, pois, traduz muito da exigência que todo cidadão pode fazer em seu favor.

Sem embargo, a educação como direito de todos aparece, pela primeira vez, na Constituição de 1934. O artigo 149 da Constituição de 1934 assim se pronuncia sobre a educação:

" A educação é direito de todos e deve ser ministrada pela família e pelos poderes públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação, e desenvolver num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana".

Na Constituição de 1946, a educação também definida como direito de todos: " A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola". Na Constituição de 1969, o artigo 176 assim se pronuncia sobre a educação como direito de todos:

" A educação, inspirada no princípio da unidade nacional e nos ideais de liberdade e solidariedade humana, é direito de todos e dever do Estado, e será dada no lar e na escola".

Como veremos, mais adiante, o direito de todos à educação é na verdade o direito social à educação. O direito social à educação concede aos cidadãos o gozo da educação como serviço público.

Vimos que a garantia da educação como direito de todos é feita através do dever do Estado de ofertá-la. É incumbência do poder público o serviço educacional. Em seguida, a família é co-responsabilizada pela tarefa de educar seus filhos. O fato novo, na Constituição Federal de 1988, é que, anteriormente, à família é dada a incumbência de "ministrar" a educação (1946, Artigo 149) ou a educação é tarefa a ser "dada no lar". (1937, artigo 128; 1969, artigo 176)."


Em análise sobre as constituições, MARTINS argumenta:
"O fato novo, na Constituição Federal de 1988, é a colaboração da família, através da promoção e do incentivo, no processo educativo. O termo colaboração indica o reconhecimento por parte do Estado da enorme tarefa que cabe à sociedade, especialmente a civil organizada, na formação dos educandos. Nada impede, portanto, que a sociedade civil organizada, representada por associações comunitárias, entidades religiosas e organizações não-governamentais, possa, em conjunto com o Estado, realizar o trabalho em comum de educar as pessoas.

No entanto, uma pergunta pode advir: a educação, como direito de todos e dever do Estado e da família, refere-se unicamente à formação escolar, que se dá nas instituições de ensino?

Cremos que a partir de 1934, a educação é vista como um processo de socialização e aprendizagem encaminhada ao desenvolvimento intelectual e ética de uma pessoa. Decerto, é essa a maior contribuição dos parlamentares na fase republicana: a socialização do conhecimento formal.

A Carta de 1824 ou mesmo a Constituição de 1891 parecem ter indicado a educação apenas instrução por meio da ação docente e não como instrumento de comunicação em favor da cidadania e da produção."

Analisando o conteúdo disposto no dispositivo legal nº 206 da Carta Magna, GARCIA discute:
"Esta obrigação estatal para com seu cidadão não se limita apenas a este dispositivo, "que poderia soar como mera enunciação de uma norma programática", se estendendo a criação de políticas estruturais, como o estabelecimento de condições iguais para o acesso e permanência na escola (Art. 206, I), a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais (Art. 206, IV), a garantia de padrão de qualidade (Art. 206, VII), o ensino fundamental obrigatório (Art. 208, I), a progressiva universalização do ensino médio gratuito (Art. 208, II), entre muitas outras, garantindo a exigibilidade do dever do Estado a sua ampla e irrestrita efetividade."
O fator nuclear da propositura da política de cotas observa que apenas pela educação (não entendida pela educação formal e seus dogmatismos) é possível alcançar um nível social mais confortável e um arcabouço teórico mais abrangente e consistente, ao passo que a educação deve ser encarada em sua área de maior influência, numa abordagem muito mais ampla do que aquela visão ligada ao confinamento em um espaço físico para ser aculturado e formatado, afinal educação tem uma configuração muito mais ampla e muito mais profunda. Passemos então para uma análise histórica das concepções pedagógicas enunciadas no inciso III do artigo 206.
Na história da educação, surgiram algumas correntes doutrinárias originadas do cenário social, cultural e político de cada época. Dando um foco à educação escolar, sugiro que passemos a observar um pouco do instituto que, ideologicamente, detém o maior poder centrípeto de padronização social e castração às possibilidades de ascensão social, difundindo entre docentes e discentes tendências, preceitos e preconceitos que devem ser amplamente discutidos e criteriosamente analisados. Buscarei, brevemente, discorrer nesses próximos parágrafos analisando um pouco da filosofia da educação, relatando sobre as tendências pedagógicas desenvolvidas nos determinados contextos históricos enquanto fruto de tensões sociais e reorganização das sociedades a fim de extinguir ou reduzir tais conflitos.
Sob essa ótica, parafraseio o professor Cipriano Luckesi. LUCKESI diz que há duas grandes tendências ligadas às três principais concepções filosóficas e sociológicas que analisa a educação e a posição dos indivíduos frente à ideologia pregada ou pretendida pelo Estado:


Quadro 1 - Tendências pedagógicas e suas concepções filosóficas.

TENDÊNCIA REDENTORA DA EDUCAÇÃO

            Na tendência redentora, criada à luz da sociologia estrutural das funções da sociedade desenvolvida por Émile Durkheim, a educação serve para redimir os pecados do Homem, principalmente o pecado da ignorância a fim de que possa ser reincorporado à realidade harmônica e perfeita do organicismo social. Para os seguidores desta tendência, o aluno (a =ausência, lumini = luz) é concebido com uma tábua rasa ou uma caixa vazia e o professor um artesão ou recipiente cheio da substância da sabedoria e do conhecimento, de sorte que, seria através da transmissão de conhecimentos que os discentes estariam aptos a receber o legado da retidão, da ética e da moral social com o princípio da necessidade de retornar à perfeição. Essa concepção filosófica tem grande relação com os preceitos teológicos, fator muito influente na época da propositura desta tendência.

TENDÊNCIA REPRODUTIVISTA DA EDUCAÇÃO

            Na tendência reprodutivista, decorrente da sociologia weberiana, há uma preocupação com a diagnose dos problemas sociais analisando as ações como fruto de atos que detinham significados sociais específicos, reduzindo-se, entretanto à diagnose e análise dos fatores sociais sem buscar ou propor medidas que reduzissem ou extinguissem os problemas. Era uma tentativa de descrever analiticamente uma determinada situação sob a influência do fato social desenvolvido pelo sociólogo Max Webber.

TENDÊNCIA TRANSFORMADORA DA EDUCAÇÃO

            Nesta tendência pedagógica, a diagnose sem a proposição de medidas é inútil, pois o mero exercício da dialética não se efetiva em seu objeto mais importante que é a interferência na realidade através do que Karl Marx chamou de práxis que é a faculdade de ação de modificar o espaço, pondo-se na condição de sujeito agente e não sujeito objeto. Para Marx, o indivíduo não pode estar alheio a tantas coisas influentes de sua realidade e é somente de posse dessas informações que poderá haver a modificação da realidade. Nestas linhas gerais, que retomam o ideal de educação integral do ser humano desenvolvido na Antiguidade Clássica, o ser deve ter todas as potencialidades estimuladas e suas deficiências de aprendizado tomadas como particularidades que devem ser entendidas e ainda com mais força exercitadas. A relação ensino-aprendizagem aqui é tomada com o ideal de construção do conhecimento à medida da construção, desorganização e reconstrução do ser humano, de seus ideais e desejos mais latentes. O ser humano é considerado em seu mais alto nível de complexidade enquanto organismo que é fruto de processos biopsicossociais.
CURY, indo um pouco adiante, faz uma análise muito pertinente no que concerne à implantação efetiva do direito à educação:
"Mesmo com declarações e inscrição em lei, o direito à educação ainda não se efetivou na maior parte dos países que sofreram a colonização. As conseqüências da colonização e escravatura, associadas às múltiplas formas de não-acesso à propriedade da terra, a ausência de um sistema contratual de mercado e uma fraca intervenção do Estado no sistema de estratificação social produzirão sociedades cheias de contrastes, gritantes diferenças, próprias da desigualdade social. A persistência desta situação de base continua a produzir pessoas ou que estão "fora do contrato" ou que não estão tendo oportunidade de ter acesso a postos de trabalho e bens sociais mínimos.
Isto explica o enorme número de pessoas que sequer possui educação primária, sendo ainda grande o número de pessoas que possui poucos anos de escolaridade. A pirâmide educacional acompanha muito de perto a pirâmide da distribuição da renda e da riqueza.
Para os tempos contemporâneos, em que vai se constituindo a chamada "sociedade do conhecimento", a distância entre pobres e ricos aumenta também por causa do acesso aos conhecimentos disponíveis e às novas formas de linguagem que necessitam de uma socialização própria. Essa distância também tem aumentado a distância entre países ricos e países pobres, no momento em que o conhecimento tem-se constituído em mais-valia intelectual e base para o desenvolvimento auto-sustentado dos países.
Isto não quer dizer que se deve diminuir a importância da declaração de direitos. Declarar um direito é muito significativo. Equivale a colocá-lo dentro de uma hierarquia que o reconhece solenemente como um ponto prioritário das políticas sociais. Mais significativo ainda se torna esse direito quando ele é declarado e garantido como tal pelo poder interventor do Estado, no sentido de assegurá-lo e implementá-lo."
POLÍTICA AFIRMATIVA DE COTAS

Pensar de maneira imediatista sobre as políticas afirmativas de cotas ou tentar desvinculá-las de outros programas sociais de cunho não-assistencialista implicaria incorrer numa análise jus filosófica, histórica, sociológica e antropológica pouco criteriosa acerca do principio constitucional da isonomia, observando que este comporta duas espécies distintas e independentes, a saber: igualdade formal e igualdade material, conforme versaremos a seguir.
Isonomia formal

Entende-se por igualdade formal o princípio explicito gravado no dispositivo constitucional através do art. 5º que versa:
"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade[...]".
Nesse entendimento, todos são iguais em oportunidades, características e necessidades e a dimensão histórica dos agentes é ignorada com o único objetivo de causar uma pseudo segurança jurídica e, em decorrência disso, acaba por tentar silenciar tensões sociais sob a égide de instituir uma nação cuja isonomia reina imperiosa e onde não há desigualdades sociais ou diferenças relevantes à construção de uma cultura pautada no respeito e no pluralismo de ideias e de pertencimentos sociais.
Pensar que todos nós temos as mesmas oportunidades e condições é, na verdade, permitir que seja difundida a ideologia que os seres integrantes deste País tem a mesma origem, condição financeira e igualdade numa série de outros mecanismos de controle e segregação social. Esses instrumentos, na verdade, servem como institutos diretivos que imprimem na população um sentimento de impotência frente a políticas e programas pensadas pelas camadas mais abastadas econômica e intelectualmente para que se mantenha a situação de miserabilidade e submissão dos demais partícipes desta sociedade.
Isonomia material

É um entendimento mais moderno que concebe que o direito positivado, ou seja, expresso através de uma lei por si só não é capaz de ter sua máxima aplicabilidade no sentido de traduzir os interesses e aspirações da sociedade e tomando uma dimensão mais forte no que tange à urgência por ultrapassar os padrões pré-estabelecidos (estereótipos) a fim de que seja instaurada de maneira real a igualdade fixada na Carta Constitucional.
A expressão desta premissa, onde se deve tratar desigualmente os sujeitos que vieram sendo tratados historicamente de maneira diferente, fundamenta-se principalmente através do binômio socioeconômico que se estabelece na relação dominante-dominado.
A dimensão histórica mantém, ainda hoje, uma influência muito marcante na própria organização da dinâmica populacional brasileira que pouco tem se modificado com relação à instituição de poder e manutenção do status quo da classe dominante. Esse fator histórico que ainda se mantem como ranço da herança escravista é indispensável à compreensão de algumas situações de supressão dos direitos e liberdades de alguns grupos que ainda permanecem, mesmo agora na segunda década do século


Fonte:
http://www.artigonal.com/direito-artigos/direitos-e-garantias-fundamentais-uma-analise-socio-antropologica-do-surgimento-e-implantacao-dos-direitos-humanos-5513388.html


Acadêmico das graduações nos cursos de Licenciatura Plena em Pedagogia pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e Bacharelado em Direito pela Faculdade Metropolitana da Grande Recife (FMGR).

O Movimento Pós Positivista e sua contribuição para a realização da meta da Ciência Jurídica: Justiça


RESUMO

Trata-se de artigo voltado ao evidenciamento de contribuição ofertada pelo movimento pós-positivista, no que tange à concretização da finalidade da ciência jurídica, qual seja a Justiça. Em prol da explicitação de tal evidência, alguns aspectos tidos como imprescindíveis serão abordados, tais como: o Direito sob o aspecto de ciência humana e, por isso, dinâmico, incapaz de sobreviver se atrelado exclusivamente à estaticidade das normas; a necessidade de adoção de abordagens jurídicas, nos casos concretos, pautadas em caráter principiológico; os malefícios causados ao Direito em função da aplicação do positivismo exacerbado e, por fim, a função social inferida aos aplicadores do Direito, especialmente aos juízes, quando da aplicação das leis nos casos reais.
  PALAVRAS-CHAVES: PÓS-POSITIVISMO; DIREITO; JUSTIÇA.

ABSTRACT

It's about article which objective is manifest the contribution offered by post positivist movement, about the concretization of target whose juridical science is holder, Justice. In order to show this evidence, some issues considered essentials will be analyzed, just like: Law seen as a human science and, because of that, dynamic, unable to survive if joint only to static juridical rules; the necessity of welcome approaches, in real case, based in principles; disadvantages brought to Law by the use of exaggerated positivism and, finally, the social function that have jurisconsults, especially judges, when applying the rules in real situations. 
KEYWORDS: POST POSITIVISM; LAW; JUSTICE.
  
INTRODUÇÃO

Na sociedade pós-moderna em que vivemos e a qual exige soluções urgentes e justas para os conflitos que nela emergem diariamente, incabível é a aceitação da prática do Positivismo exacerbado, ainda hoje largamente praticado, como meio mais adequado e viável para obter soluções relativas às lides oriundas do seio social, na medida em que este se mostra incapaz de nortear o Direito, instrumento social, na sua dura caminhada pela busca da justiça.
Em termos claros e objetivos, a postura positivista, hodiernamente, representa um considerável entrave para a plena realização da ciência jurídica, na medida em que prega e impõe o isolamento desta dos demais ramos científicos, o que é absurdo e repugnante se compreendermos que não há meio de garantir a sobrevivência e eficácia do Direito sem pô-lo em completo contato com os demais ramos dos saberes, tais como a Filosofia, Sociologia e Antropologia, por exemplo, por serem diretamente atuantes na sociedade, na mesma sociedade onde age a ciência jurídica.
O Positivismo não possui por si só competência e habilidade suficientes para dar à sociedade todas as respostas que a mesma necessita, quando da ocorrência de conflitos. Isso, na prática, pode ser facilmente observado e se dá pela insuficiência de conteúdo contido nas letras da lei ou mesmo pela ausência de norma positivada a ser aplicada em determinado caso.
Não se há de negar a enorme necessidade de aplicação do agir jurídico concatenado aos saberes e ciências diversas dele e isso se justifica por meio de uma explicação bem singela, afinal, como impedir a manifestação e convívio do Direito, enquanto ciência social aplicada e, sobretudo, humana, com o meio social? Privá-lo desse convívio e dessa manifestação significa impedi-lo de entrar em contato com os fatos sociais ocorrentes na sociedade para a qual está voltado e que, por sua vez, é carregada de conteúdo principiológico com esfera íntima interligada a muitas outras ciências.
Prezar pelo isolamento jurídico é tornar a ciência do Direito literalmente cega, alheia àquilo que serve, é concebê-la de maneira atomística, é deixá-la desbussolada e desarmada.
É nesse contexto que surge heroicamente o movimento pós-positivista, guardando em seu bojo a salvação do Direito, condenado por muitos quando da postura positivista, bem como as esperanças de sua plena eficácia e sobrevivência.
I-             DA JUSTIÇA COMO FIM DO DIREITO E DA SOCIEDADE

Antes de inferir à Justiça o status de meta da ciência jurídica, importante se faz elucidar e citar seu conceito.
Considerando as idéias expostas especialmente por Platão e Aristóteles, no que diz respeito à Justiça, Ulpiano elaborou um dos mais conhecidos e adotados conceitos de Justiça, definindo-a como a constante e firme vontade, tida por um indivíduo, de dar a cada um aquilo que é seu.
Em verdade, muitas foram as contribuições em área filosófica para a formação e compreensão da idéia de justiça. Platão e Aristóteles, por exemplo, ajudaram na visualização da mesma como virtude superior verdadeiramente humana, relacionando-a amplamente com a noção de bem que, por sua vez, não pode se centrar apenas no indivíduo, mas na coletividade, tendo em vistas o bem comum.
Para eles, não existe sociedade perfeita sem que nela haja a justiça, o que nos leva a crer que em suas concepções toda a sociedade tem como meta o alcance do justo, que também é almejado pelo Estado como mais alta finalidade.
De fato, o homem como ser político e consciente, escolhe viver em sociedade com animus de proporcionar justiça a todos, alcançar o bem estar social que se traduz na concretização do justo.
A Justiça, na visão platônica, se perfaz na ordem, eficácia e racionalidade. A ordem se faz representada pelo conjunto de leis, o que pela lógica, exige um sistema jurídico; a eficácia se observa no momento da prestação da tutela jurisdicional com a materialização da lei, ou seja, seu cumprimento; a racionalidade, por fim, constitui-se na desejabilidade do justo, na vontade interior possuída por cada indivíduo de praticar a virtude do justo.
Para Aristóteles, a virtude acima posta está intimamente relacionada à ética. Essa relação por ele ressaltada facilita o entendimento do que antes já tinha sido exposto pelos sofistas: a afirmação de que a justiça é relativizada, afinal, dependendo do momento histórico, o que justo é hoje pode não parecer mais como tal amanhã.
De qualquer forma, após muitos estudos e observações, Aristóteles concluiu que não há outra finalidade relativa ao Direito senão a justiça, que deve permear sobre as normas por meio de conteúdo ético.
Não é tarefa complexa compreender as concepções filosóficas que de igual forma entendem a justiça como meta, seja do Direito ou da própria sociedade e Estado. Isto porque sendo a ciência do Direito uma ciência humana que atua na sociedade, criando normas para regulamentar o bem estar social, deve primar pela concretização da justiça, dando a cada um o que lhe é de direito, enxertando em suas normas princípios e todo o mais necessário para tornar a norma criada totalmente compatível com os valores consagrados pela sociedade.
É no seio da sociedade que nasce a norma jurídica e nele deve atuar com eficiência, justiça, fazendo assim com que se torne um instrumento de libertação, na visão sofista, e não de opressão.

II- DIREITO E SOCIEDADE

Como Já dito anteriormente, o Direito é ciência social aplicada, humana. Nesse sentido, tem como âmbito de atuação a sociedade onde se constitui, passando a ser instrumento a serviço dela, a serviço de seu benefício, individualmente e coletivamente considerada.
Por ser ferramenta destinada ao alcance e garantia do bem estar social, deve se utilizar de todos os meios para obtê-lo e mantê-lo, o que significa dizer que o Direito não pode ser ciência isolada, devendo estar em permanente contato com o seio social, captando o que ocorre na mesma, em termos principiológicos e valorativos, para que seja capaz de elaborar normas condizentes com as necessidades da comunidade e com os valores por ela cultivados, sob pena de não gozar de eficácia e, consequentemente, ser inútil ao ambiente social.
Por essa razão diz-se que as normas jurídicas são invadidas por normas éticas e têm bases principiológicas, pois a eficácia das leis implementadas pelo Direito dependem quase que totalmente do respeito à ética tido pelas mesmas, aos valores que se fazem constantes no seio da sociedade.
Somente acompanhando a sociedade e seus valores a ciência jurídica será capaz de fazer viger leis com caráter educativo, legítimas e realmente válidas sob todos os aspectos que a circulam, afinal, ela deve se ajustar à realidade a partir dos valores morais.
Deve o Direito seguir os passos dados pela comunidade na qualidade de servo, servo contratado para administrar os fatos e atos humanos, de maneira a conciliá-los com a manutenção e garantia do bem social.

III- PRÁTICA JURÍDICA SOB A ÉGIDE POSITIVISTA

Funciona a Teoria Positivista, defendida por Kelsen, tendo por premissa a idéia de que o Direito se resume a um sistema de normas jurídicas isolado de tudo o que lhe é alheio, de tudo o que não lhe é comum, fazendo com que este não possa misturar-se com nenhum outro ramo de conhecimento, presente ou não na sociedade.
Ocorre que, como facilmente se pode perceber, existe um sério comprometimento causado por esta teoria à ciência jurídica, na medida em que isolá-lo acarretaria em impedi-lo de agir validamente, ou seja, nos conformes do que exige a sociedade a qual serve, além do fato de que esta base teórica, como bem lembra Perelman, despreza por total o papel da argumentação que, aliás, tão estimada foi pelos sofistas, quando da defesa da concretização da justiça.
Ora, como pode ainda haver entendimento neste sentido se ao observar a sociedade, observa concomitantemente o Direito uma série de princípios valorativos e ramos dos mais variados tipos de saber? Deve o legislador ignorar a moral social, fingir que não tem importância os valores firmemente presentes nela? Como poderia haver criação e aplicação de norma sem a observância de tudo o que afeta a sociedade de alguma maneira?
É, inquestionavelmente, inviável e pouco inteligente conceber a prática jurídica aliada ao positivismo como meio válido para exercer a serventia social.
O fato que deve ser lembrado é o de que em hipótese alguma poderia haver criação de ordenamento jurídico hábil a solucionar conflitos presentes e futuros, o que ocorre em função da estaticidade das normas e, especialmente, da dinamicidade da sociedade, realidades contraditórias neste aspecto.
É dessa realidade factual que deveria, em tese, ter o Direito consciência, não se submetendo à estaticidade normativa mas sim, ao contrário, lançando mão de meios capazes de lidar com a dinamicidade dos objetos com que trabalha.
Sociedades são compostas por pessoas humanas, pessoas humanas estão aptas a mudar, já que a mudança faz parte da natureza do homem. A conseqüência do constante mudar se traduz na alteração de realidade social, na ocorrência de novos fatos, no advento de novos costumes. Diante desse fato, a literalidade da lei criada em determinado período histórico, inevitavelmente, se mostra insuficiente para resolver as lides que surgem em função das novas alterações sociais.
Ver o Direito atomizado resulta em sua ineficácia diante dos desejos comunitários. Não deve, portanto, predominar o positivismo que tanto sufoca o fenômeno jurídico, impedindo-o de alcançar o que não é impossível, a justiça.
De que serve um instrumento com defeito? É o defeito justamente o efeito causado pela prática positivista na esfera jurídica.
Prender os juristas nas grades da literalidade da lei rompe com o sonho de justiça promovido pelo Direito e pela própria sociedade, além de frustrar os aplicadores da lei que visualizam na ciência jurídica meio plenamente capaz de realizar o justo.
Muito embora, como já se disse anteriormente, não possa o legislador criar leis que tenham garantia de efetividade por período eterno, pode o Direito acompanhar a dinamicidade social por meio de outros métodos, aliás, de seus métodos próprios.

IV- BREVE COMENTÁRIO ACERCA DO MOVIMENTO PÓS-POSITIVISTA

Em uma realidade marcada pela necessidade de respostas aos conflitos sociais, surge o pós-positivismo como alternativa de resolução das lides submetidas à apreciação do Direito, bem como forma de permitir à ciência jurídica acompanhar a dinamicidade do meio e realidade sociais, permitindo a ela o cumprimento de sua função e o alcance de sua meta.
Pois bem, constitui-se o pós-positivismo, basicamente, na admissão de que o Direito é, de fato, uma ciência indissociável de todas as demais, primando pela existência de princípios como verdadeiros e eficazes norteadores da norma jurídica.
A postura pós-positivista possibilita a resolução de possíveis lacunas ou antinomias passíveis de estar no ordenamento jurídico, haja vista utilizar-se de conduta voltada ao uso de princípios, jurisprudências e doutrinas como recursos aptos a possibilitar ao Direito o desfrute de uma vida real capaz de proporcionar o alcance de sua finalidade.
Observa-se nos dias atuais, felizmente, uma tendência crescente do movimento pós-positivista, fato que nos permite, enquanto aplicadores, estudiosos do direito ou mesmo integrantes da sociedade, promover certa comemoração, no sentido de que o movimento citado é o grande sinal do sucesso prático da teoria jurídica.

V- DA FUNÇÃO SOCIAL DOS APLICADORES DO DIREITO

O repensar de conceitos jurídicos contaminados pelo positivismo tem-se feito presente em larga escala na prática jurídica, o que, em verdade, demonstra eficácia do pós-positivismo, no que diz respeito a sua atuação na resolução de conflitos sociais antes não resolvidos pelos positivistas.
Advogados, Promotores, Defensores, Procuradores, Delegados, Juízes e muitos outros aplicadores da norma jurídica, hoje, compõe o grande quantitativo do movimento pós-positivista, de modo que em suas peças, pareceres, relatórios ou sentenças têm usado não raramente conteúdo de base eminentemente principiológica, como meio de atingir o feito da justiça. Isso por reconhecerem a insuficiência e falha das normas se apartadas dos princípios que nortearam sua criação.
A postura pós-positivista ativa dos juristas nos revela que, finalmente, os mesmos atingiram um ponto muito importante de sua vida profissional: o entendimento de que estes possuem um papel social cujo objetivo deve ser a promoção de facilitação do alcance de uma sociedade mais justa. O exercício correto de seu papel, portanto, é incompatível com a primazia do positivismo, que parece enlaçar suas idéias, restringindo-as e prejudicando a execução do benefício social.
Não se pode ter dúvidas de que o Direito deve expulsar do interior de sua órbita tudo aquilo que lhe tolir de realizar a Justiça, seja ela vista sob a óptica particular, na visão sofista, ou sob a esfera da coletividade, como defendida por Platão, ou até mesmo sob a visão aristotélica, visualizadora da justiça no âmbito individual e coletivo.
Não obstante a importância de atuação principiológica por todos os aplicadores da norma jurídica, ressalte-se a relevância da prática da atividade jurisdicional. Impresso está aos juízes um papel de grande importância na sociedade: o de concretizar a justiça por meio de suas sentenças.
Antes amarrados à conduta positivista, atualmente os magistrados agem de modo a aceitar plenamente os princípios como instrumento indispensável para a compreensão do real significado da norma, em outros termos, buscam, no momento atual, bem mais do que cumprir a literalidade da lei, desejam utilizar-se do necessário para fazer a justiça, virtude que, vale a pena lembrar, ainda é a responsável pela legitimação dos diplomas normativos.
Aspecto interessante é o de que se encontra expressa nas decisões pós-positivistas o que Aristóteles considerava primordial para a realização da Justiça: a desejabilidade, a vontade de fazê-la real e atuante no corpo social.
Os juízes, nesse contexto, parecem tirar de suas entranhas o desejo de vê-la florescer, fazendo valer a função para o qual foi criado e demonstrando entendimento de que, como Perelman afirma, o juiz não é apenas uma boca voltada para o pronunciamento da literalidade da lei, pensamento defendido por Montesquieu.
A restrição ao conteúdo superficial da norma faz de um juiz que assim age mero técnico, praticando o que chamamos de subsunção.
Cabe, na verdade, ao magistrado, por meio da utilização de argumentação e retórica, demonstrando sua convicção, encontrar a solução mais adequada para cada caso em concreto, adaptando a estaticidade do prescrito legal ao dinamismo da decisão judiciária, dando, dessa forma, vida real ao Direito, garantindo sua efetividade enquanto instrumento social.
As leis, significativamente, devem ser consideradas apenas como diretrizes a serem usadas pelos juízes que, por sua vez, devem julgar como se não houvesse no sistema normativo lacunas ou antinomias, afinal, estas são superadas quando da aplicação das bases principiológicas e socio-valorativas.
Vale trazer à baila a constatação de que a transmissão de segurança e equidade pelo Direito à sociedade só é possível se aceitarmos a necessidade e benefícios trazidos pela interação entre jurisprudência e doutrina, por sua vez, formadas pelos julgados e análise destes, realizados respectivamente por juízes e estudiosos da ciência jurídica, os quais se fundamentam em fatores localizados em muito além da literalidade da lei.
O que fundamenta a utilização de princípios e valores pelo magistrado é o fato de que este deve ser imparcial e não neutro, devendo usar, em função disso, seu senso de equidade, adaptando-o sempre que possível á legislação vigente e também aos precedentes judiciários.
Facilmente se encontram julgados que se amoldam ao pós-positivismo, a exemplo dos que são proferidos pelo Juiz Federal David Dantas, 47 anos, que se empenha em decidir baseado nas condições sociais, nos princípios e não somente preso ao conteúdo gramatical e superficial da letra da lei. Manifesta-se nele, uma vez mais, a desejabilidade do justo.
De forma pós-positivista também decidiu o relator Wander Marotta, em segundo grau, sobre Apelação Cível n° 1.0702.07.345659-3/001, quando optou por cassar decisão de primeiro grau que extinguiu Ação de alimentos sem resolução do mérito com fundamento de que não tinha legitimidade para figurar no pólo passivo de ação de alimentos espólio. Considerou este relator a necessidade de amparo da filha menor do de cujus, fato que, ao seu ver, plausivelmente, supera questão processual de impossibilidade do Espólio como figurante do pólo passivo.
Comuns, de igual forma, estão se tornando os artigos e estudos a respeito da função social do juiz e da importância do pós-positivismo em sua prática profissional. Na revista Visão Jurídica, por exemplo, foi publicada matéria, no mês de fevereiro deste ano, intitulada "Senso Comum no Raciocínio do Juiz: Magistrados precisam equilibrar saber jurídico e não-jurídico para cumprir papel decisório".
A tendência pós-positivista parece estar ocupando agora o lugar que sempre deveria ter ocupado, ao lado do Direito, auxiliando-o à obter junto à sociedade as soluções para os conflitos nela surgidos.

VI – A CONTRIBUIÇÃO DO MOVIMENTO PÓS-POSITIVISTA PARA A REALIZAÇÃO DA JUSTIÇA

Nos termos de tudo o que foi posto neste corpo textual, simplificada se torna a tarefa de elucidar a existência da grande contribuição dada ao Direito pelo movimento pós-positivista. Vejamos.
Como inicialmente visto, não há outra meta para a ciência jurídica senão a Justiça, esteja ela em que óptica estiver, individual, pressupondo o outro ou ainda ambas.
Ora, realizar a Justiça, levando em consideração o conceito de que ela se perfaz no ato de dar a cada um o que lhe é de direito, depende do contato direto entre Direito e sociedade, assim tida como local de atuação de muitos ramos de conhecimento e saberes diversos, bem como ambiente permeado de carga principiológica.
Essa dependência de contato se dá porque a identificação do que é tido como justo pelo meio social depende do contato direto entre ciência jurídica e meio social.
Ao entrar em contato com a sociedade, o Direito, automaticamente, conhece de todos os demais ramos de conhecimento, por serem atuantes no meio social, afinal, este também é o seu meio de atuação.
A concepção Positivista ao colocar a ciência jurídica em uma bolha isolada, impede que o mesmo obtenha a realização de seu objetivo, pois como pode conhecer esta o que é justo em um determinado período sem analisar tudo o que atinge direta e indiretamente a sociedade?
Para atingir o conhecimento pleno do ambiente social, seu ambiente de trabalho, exige-se do Direito que este contemple todos os princípios e valores cultivados e espelhados naquele, para que, então, saiba distinguir de que forma deve agir ou ser criada a norma para que seja justa na visão da comunidade, para que seja dotada de legitimidade e eficácia real.
Neste sentido, aparece o movimento pós-positivista como substituto mais que competente da corrente positivista, no sentido de que permite ao Direito o uso e análise de princípios e valores em sua atividade.
Os princípios e valores são primordiais, como se presume do que já foi exposto, para que o Direito e a sociedade caminhem de mãos dadas, garantindo ao primeiro a dinamicidade necessária para produzir a justiça em qualquer época.
Não há mais como se admitir a noção de positivismo como meio mais adequado de atuação do Direito, na medida em que este, de fato, traz grandes malefícios á ciência jurídica, impedindo-a de oferecer a quem serve, sociedade, a garantia de justiça.
Ao contrário, as posturas pós-positivistas fortalecem o Direito, dando e ele grandiosas garantias, no que tange a sua sobrevivência, eficácia, utilidade e dinamismo, afinal, é justamente nos princípios e valores, amplamente consagrados por essas condutas, que faz morada o verdadeiro juízo do que é ou não justo.
  
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora. 1995. p.  135.

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 4° ed. Martins Fontes, São Paulo, 1995.

MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. 9° edição. São Paulo: Saraiva, 2008.

BARBOSA, Júlio César Tadeu. O que é Justiça. São Paulo: Abril Cultural:
Brasiliense, 1984.

MORRALL, John B. Aristóteles. Tradução de Sérgio Duarte. Brasília: Universidade de Brasília, 2000.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.


Fonte:
http://www.artigonal.com/direito-artigos/o-movimento-pos-positivista-e-sua-contribuicao-para-a-realizacao-da-meta-da-ciencia-juridica-justica-1168230.html



Mithyl Alves Gomes
Bacharel em Direito pela Faculdade Integrada Brasil Amazônia - FIBRA/PA

Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Uniderp