História de Catador de Caranguejo
Carlos A Caccia
Seu Nico
Em meados
dos anos sessenta, Seu Nico não era simplesmente catador de caranguejo.
Ele era
parte do mangue na Mata do Engenho Uchôa
na cidade de Recife; conhecia tudo por lá como a palma da mão.
Há quem diga que
ele começou a gatinhar
e andar pescando e catando caranguejo.
Quem conhece um
manguezal sabe da riqueza
que é aquilo
e, por saber
disso, é que Seu
Nico tinha um
respeito, uma amizade
e um carinho
fraternal pelo
lugar. Por
mais de cinquenta anos,
dia após dia de lá
tirava o sustento da família. Só não saia pra catar caranguejo com tempo muito ruim ou na época de reprodução que ele sabia quando como se fosse caranguejo.
O perigo
Pois bem, certo dia Seu Nico entrou
no bar do Bento
meio assustado e contou que, dois dias
atrás, já no final
da tarde, quando
o sol começava a dar
sua ultima espiada
do dia por
traz das arvores, ele atolado até perto da cintura, como é de costume
nessa atividade, se pegou admirando o céu sem nuvem e as águas,
que com
o restinho de raios de luz que o sol lançava, formava um
caminho de luz
em sua
direção de um
amarelo lindo, contrastando com a azul já num tom
caindo para o escuro, era sua ultima enfiada de mão
na lama do mangue
pra ver se
tirava mais um
caranguejo e assim
terminar seu dia.
Sua mão ficou presa em alguma coisa, parecia galho
de arvore, e por mais
que tentasse, não
havia jeito de se soltar.
A água começou a subir
e seu rosto
estava rente a lama.
Um desespero
tomou conta dele porque
sabia que se não
conseguisse soltar a mão seria seu fim.
Começou a fazer força
e todo tipo
de movimento até a exaustão,
e a mão não
saia.
Aos poucos o sol
foi se escondendo, deixando somente aquele resto de
claridade que
todos os dias
lhe servia de lanterna
na volta pra
casa. A água
já tinha
subido tanto que
o esforço pra
manter a cabeça
fora da água
causava uma dor dilacerante
no pulso e no pescoço.
Já estava rezando para
que seu
fim fosse rápido
e não sofresse, ao mesmo
tempo,
lamentava tanta
coisa que poderia ter feito. Os filhos
que não
veria crescer, a vez
que não
acompanhou seu mais
velho no jogo
de futebol porque
queria descansar e até
não ter levado a mulher
naquela excursão para
o Recife onde
queria comprar roupas.
Sentiu que naquele momento, o sol, seu
companheiro de tantos
anos de trabalho,
parecia deitar mais
rápido que
o de costume, talvez
pra não
ter que ver o triste fim do amigo.
O forasteiro
intervém
Já tinha
perdido as esperanças quando escutou um
barulho na mata. De rabo
de olho viu se aproximar
um sujeito com a mesma descrição do homem que por vezes era visto
perambulando pela cidade. Disse que o tal homem, que ele jurava ser o forasteiro,
andava sem afundar
na lama do mangue,
chegou perto se deitou na lama e afundou; ele
sentia a mão do homem
escorregando por seu
braço até
a mão e, como por
mágica, ela
se soltou. Contou que já estava de pé
com o coração
batendo tão forte
que dava pra
se ouvir de longe,
quando o estranho
foi se erguendo de dentro da lama onde
estava mergulhado por inteiro até ficar de pé em cima dela sem afundar e tão limpo como
chegou. Do mesmo jeito
que ele
apareceu, voltou e sumiu mata adentro
sem dizer nada. Seu Nico
tentou falar com
ele, agradecer
ao menos, mas
o choro,
misto de alivio e alegria, não
deixou a voz sair;
ainda muito
assustado, pegou o mais rápido que pode
tudo que
já tinha
conseguido de caranguejo, e iniciou a
volta pra cidade.
.
Seu Nico vai embora
Ele jurou que não voltava mais
praquele mangue. Ficou na cidade por uns
tempos. Aos poucos foi mudando o jeito rude que lhe tinha sido impresso
pelo trabalho duro e nenhum estudo. Passou a falar de
coisas boas, tinha
sempre um
sorriso quase
fraternal e até
conselho falando bonito
começou a dar. Ai, sem
mais sem
menos, pegou a família,
o pouco que
tinha e foi-se embora pra Belém. Nunca
mais se soube dele. De vez em quando alguém
afirma ter visto
Seu Nico vendendo caranguejo
lá no mercado
Ver o Peso em Belém.
Essa é mais uma história de pescador; ou não?
“A história não é importante. Importante é o sonho que a história traz consigo.”
Carlos A Caccia
Carlos A Caccia
É Mitólogo, Pesquisador,
Pensador, Filósofo e Poeta. Foi contratado pela Exterior Editora para escrever
cinco livros, entre eles, três romances, no qual dois já estão prontos para
serem lançados. É um pensador e questionador da natureza, no qual visitou mais
de 26 países, produzindo poesias e obras literárias. É Autor da série “Credo Quia Absurdum”
e das obras “Amazônia: O Manto Verde dos Deuses” e “Os Segredos de Madre Konstança” que serão publicadas
em breve.
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