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sábado, 30 de maio de 2015

A ÚLTIMA PERGUNTA (1956) (ISAAC ASIMOV)

A ÚLTIMA PERGUNTA (1956)

(Isaac Asimov)
letterA_zpsfef1bab0última pergunta foi feita pela primeira vez, meio que de brincadeira, no dia 21 de maio de 2061, quando a humanidade dava seus primeiros passos em direção à luz. A questão nasceu como resultado de uma aposta de cinco dólares movida a álcool, e aconteceu da seguinte forma.última pergunta foi feita pela primeira vez, meio que de Alexander Adell e Bertram Lupov eram dois dos fiéis assistentes de Multivac. Eles conheciam melhor do que qualquer outro ser humano o que se passava por trás das milhas e milhas da carcaça luminosa, fria e ruidosa daquele gigantesco computador. Ainda assim, os dois homens tinham apenas uma vaga noção do plano geral de circuitos que há muito haviam crescido além do ponto em que um humano solitário poderia sequer tentar entender.
Multivac ajustava-se e corrigia-se sozinho. E assim tinha de ser, pois nenhum ser humano poderia fazê-lo com velocidade suficiente, e tampouco da forma adequada. Deste modo, Adell e Lupov operavam o gigante apenas sutil e superficialmente, mas, ainda assim, tão bem quanto era humanamente possível. Eles o alimentavam com novos dados, ajustavam as perguntas de acordo com as necessidades do sistema e traduziam as respostas que lhes eram fornecidas. Os dois, assim como seus colegas, certamente tinham todo o direito de compartilhar da glória que era Multivac.
Por décadas, Multivac ajudou a projetar as naves e enredar as trajetórias que permitiram ao homem chegar à Lua, Marte e Vênus, mas para além destes planetas, os parcos recursos da Terra não foram capazes de sustentar a exploração. Fazia-se necessária uma quantidade de energia grande demais para as longas viagens. A Terra explorava suas reservas de carvão e urânio com eficiência crescente, mas havia um limite para a quantidade de ambos.
No entanto, lentamente Multivac acumulou conhecimento suficiente para responder questões mais profundas com maior fundamentação, e em 14 de maio de 2061, o que não passava de teoria tornou-se real.
A energia do sol foi capturada, convertida e utilizada diretamente em escala planetária. Toda a Terra paralisou suas usinas de carvão e fissões de urânio, girando a alavanca que conectou o planeta inteiro a uma pequena estação, de uma milha de diâmetro, orbitando a Terra à metade da distância da Lua. O mundo passou a correr através de feixes invisíveis de energia solar.
Sete dias não foram o suficiente para diminuir a glória do feito e Adell e Lupov finalmente conseguiram escapar das funções públicas e encontrar-se em segredo onde ninguém pensaria em procurá-los, nas câmaras desertas subterrâneas onde se encontravam as porções do esplendoroso corpo enterrado de Multivac. Subutilizado, descansando e processando informações com estalos preguiçosos, Multivac também havia recebido férias, e os dois apreciavam isso. A princípio, eles não tinham a intenção de incomodá-lo.
Haviam trazido uma garrafa consigo e a única preocupação de ambos era relaxar na companhia do outro e da bebida.
“É incrível quando você pára pra pensar…,” disse Adell.
Seu rosto largo guardava as linhas da idade e ele agitava o seu drink vagarosamente, enquanto observava os cubos de gelo nadando desengonçados. “Toda a energia que for necessária, de graça, completamente de graça! Energia suficiente, se nós quiséssemos, para derreter toda a Terra em uma grande gota de ferro líquido, e ainda assim não sentiríamos falta da energia utilizada no processo. Toda a energia que nós poderíamos um dia precisar, para sempre e eternamente.”
Lupov movimentou a cabeça para os lados. Ele costumava fazer isso quando queria contrariar, e agora ele queria, em parte porque havia tido de carregar o gelo e os utensílios.
“Eternamente não,” ele disse.
“Ah, diabos, quase eternamente. Até o sol se apagar, Bert.”
“Isso não é eternamente.”
“Está bem. Bilhões e bilhões de anos. Dez bilhões, talvez. Está satisfeito?”
Lupov passou os dedos por entre seus finos fios de cabelo como que para se assegurar de que o problema ainda não estava acabado e tomou um gole gentil da sua bebida.
“Dez bilhões de anos não é a eternidade”
“Bom, vai durar pelo nosso tempo, não vai?”
“O carvão e o urânio também iriam.”
“Está certo, mas agora nós podemos ligar cada nave individual na Estação Solar, e elas podem ir a Plutão e voltar um milhão de vezes sem nunca nos preocuparmos com o combustível. Você não conseguiria fazer isso com carvão e urânio. Se não acredita em mim, pergunte ao Multivac.”
“Não preciso perguntar a Multivac. Eu sei disso”
“Então trate de parar de diminuir o que Multivac fez por nós,” disse Adell nervosamente, “Ele fez tudo certo”.
“E quem disse que não fez? O que estou dizendo é que o sol não vai durar para sempre. Isso é tudo que estou dizendo. Nós estamos seguros por dez bilhões de anos, mas e depois?” Lupov apontou um dedo levemente trêmulo para o companheiro. “E não venha me dizer que nós iremos trocar de sol”
Houve um breve silêncio. Adell levou o copo aos lábios apenas ocasionalmente e os olhos de Lupov se fecharam. Descansaram um pouco, e quando suas pálpebras se abriram, disse, “Você está pensando que iremos conseguir outro sol quando o nosso estiver acabado, não está?”
“Não, não estou pensando.”
“É claro que está. Você é fraco em lógica, esse é o seu problema. É como o personagem da história, que, quando surpreendido por uma chuva, corre para um grupo de árvores e abriga-se embaixo de uma. Ele não se preocupa porque quando uma árvore fica molhada demais, simplesmente vai para baixo de outra.”
“Entendi,” disse Adell. “Não precisa gritar. Quando o sol se for, as outras estrelas também terão se acabado.”
“Pode estar certo que sim” murmurou Lupov. “Tudo teve início na explosão cósmica original, o que quer que tenha sido, e tudo terá um fim quando as estrelas se apagarem. Algumas se apagam mais rápido que as outras. Ora, as gigantes não duram cem milhões de anos. O sol irá brilhar por dez bilhões de anos e talvez as anãs permaneçam assim por duzentos bilhões. Mas nos dê um trilhão de anos e só restará a escuridão. A entropia deve aumentar ao seu máximo, e é tudo.”
“Eu sei tudo sobre a entropia,” disse Adell, mantendo a sua dignidade.
“Duvido que saiba.”
“Eu sei tanto quanto você.”
“Então você sabe que um dia tudo terá um fim.”
“Está certo. E quem disse que não terá?”
“Você disse, seu tonto. Você disse que nós tínhamos toda a energia de que precisávamos, para sempre. Você disse ´para sempre`.”
Era a vez de Adell contrariar. “Talvez nós possamos reconstruir as coisas de volta um dia,” ele disse.
“Nunca.”
“Por que não? Algum dia.”
“Nunca”
“Pergunte a Multivac.”
“Você pergunta a Multivac. Eu te desafio. Aposto cinco dólares que isso não pode ser feito.”
Adell estava bêbado o bastante para tentar, e sóbrio o suficiente para construir uma sentença com os símbolos e as operações necessárias em uma questão que, em palavras, corresponderia a esta: a humanidade poderá um dia sem nenhuma energia disponível ser capaz de reconstituir o sol a sua juventude mesmo depois de sua morte? Ou talvez a pergunta possa ser posta de forma mais simples da seguinte maneira: A quantidade total de entropia no universo pode ser revertida?
Multivac mergulhou em silêncio. As luzes brilhantes cessaram, os estalos distantes pararam.
E então, quando os técnicos assustados já não conseguiam mais segurar a respiração, houve uma súbita volta à vida no visor integrado àquela porção de Multivac. Cinco palavras foram impressas: “DADOS INSUFICIENTES PARA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.”
Na manhã seguinte, os dois, com dor de cabeça e a boca seca, já não lembravam do incidente.
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Jerrodd, Jerrodine, e Jerrodette I e II observavam a paisagem estelar no visor se transformar enquanto a passagem pelo hiperespaço consumava-se em uma fração de segundos. De repente, a presença fulgurante das estrelas deu lugar a um disco solitário e brilhante, semelhante a uma peça de mármore centralizada no televisor.
“Este é X-23,” disse Jerrodd em tom de confidência. Suas mãos finas se apertaram com força por trás das costas até que as juntas ficassem pálidas.
As pequenas Jerodettes haviam experimentado uma passagem pelo hiperespaço pela primeira vez em suas vidas e ainda estavam conscientes da sensação momentânea de tontura. Elas cessaram as risadas e começaram a correr em volta da mãe, gritando, “Nós chegamos em X-23, nós chegamos em X-23!”
“Quietas, crianças.” Disse Jerrodine asperamente. “Você tem certeza Jerrodd?”
“E por que não teria?” Perguntou Jerrodd, observando a protuberância metálica que jazia abaixo do teto. Ela tinha o comprimento da sala, desaparecendo nos dois lados da parede, e, em verdade, era tão longa quanto a nave.
Jerrodd tinha conhecimentos muito limitados acerca do sólido tubo de metal. Sabia, por exemplo, que se chamava Microvac, que era permitido lhe fazer questões quando necessário, e que ele tinha a função de guiar a nave para um destino pré-estabelecido, além de abastecer-se com a energia das várias Estações Sub-Galácticas e fazer os cálculos para saltos no hiperespaço.
Jerrodd e sua família tinham apenas de aguardar e viver nos confortáveis compartimentos da nave. Alguém um dia disse a Jerrodd que as letras “ac” na extremidade de Microvac significavam “automatic computer” em inglês arcaico, mas ele mal era capaz de se lembrar disso.
Os olhos de Jerrodine ficaram úmidos quando observava o visor.
“Não tem jeito. Ainda não me acostumei com a idéia de deixar a Terra.”
“Por que, meu deus?” inquiriu Jerrodd.
“Nós não tínhamos nada lá. Nós teremos tudo em X-23. Você não estará sozinha. Você não será uma pioneira. Há mais de um milhão de pessoas no planeta. Por Deus, nosso bisneto terá que procurar por novos mundos porque X-23 já estará super povoado.”
E, depois de uma pausa reflexiva,
“No ritmo em que a raça tem se expandido, é uma benção que os computadores tenham viabilizado a viagem interestelar.”
“Eu sei, eu sei”, disse Jerrodine com descaso.
Jerrodete I disse prontamente, “Nosso Microvac é o melhor de todos.”
“Eu também acho,” disse Jerrodd, alisando o cabelo da filha.
Ter um Microvac próprio produzia uma sensação aconchegante em Jerrodd e o deixava feliz por fazer parte daquela geração e não de outra. Na juventude de seu pai, os únicos computadores haviam sido máquinas monstruosas, ocupando centenas de milhas quadradas, e cada planeta abrigava apenas um. Eram chamados de ACs Planetários. Durante um milhar de anos, eles só fizeram aumentar em tamanho, até que, de súbito, veio o refinamento. No lugar dos transistores, foram implementadas válvulas moleculares, permitindo que até mesmo o maior dos ACs Planetários fosse reduzido à metade do volume de uma espaçonave.
Jerrodd sentiu-se elevado, como sempre acontecia quando pensava que seu Microvac pessoal era muitas vezes mais complexo do que o antigo e primitivo Multivac que pela primeira vez domou o sol, e quase tão complexo quanto o AC Planetário da Terra, o maior de todos, quando este solucionou o problema da viagem hiperespacial e tornou possível ao homem chegar às estrelas.
“Tantas estrelas, tantos planetas,” pigarreou Jerrodine, ocupada com seus pensamentos. “Eu acho que as famílias estarão sempre à procura de novos mundos, como nós estamos agora.”
“Não para sempre,” disse Jerrodd, com um sorriso. “A migração vai terminar um dia, mas não antes de bilhões de anos. Muitos bilhões. Até as estrelas têm um fim, você sabe. A entropia precisa aumentar.”
“O que é entropia, papai?” Jerrodette II perguntou, interessada.
“Entropia, meu bem, é uma palavra para o nível de desgaste do Universo. Tudo se gasta e acaba, foi assim que aconteceu com o seu robozinho de controle remoto, lembra?”
“Você não pode colocar pilhas novas, como em meu robô?”
“As estrelas são as pilhas do universo, querida. Uma vez que elas estiverem acabadas, não haverá mais pilhas.”
Jerrodette I se prontificou a responder. “Não deixe, papai. Não deixe que as estrelas se apaguem.”
“Olha o que você fez,” sussurrou Jerrodine, exasperada.
“Como eu ia saber que elas ficariam assustadas?” Jerrodd sussurrou de volta.
“Pergunte ao Microvac,” propôs Jerrodette I. “Pergunte a ele como acender as estrelas de novo.”
“Vá em frente,” disse Jerrodine. “Ele vai aquietá-las.” (Jerrodette II já estava começando a chorar.)
Jerrodd se mostrou incomodado. “Bem, bem, meus anjinhos, vou perguntar a Microvac. Não se preocupem, ele vai nos ajudar.”
Ele fez a pergunta ao computador, adicionando, “Imprima a resposta”.
Jerrodd olhou para a o fino pedaço de papel e disse, alegremente, “Viram? Microvac disse que irá cuidar de tudo quando a hora chegar, então não há porque se preocupar.”
Jerrodine disse, “E agora crianças, é hora de ir para a cama. Em breve nós estaremos em nosso novo lar.”
Jerrodd leu as palavras no papel mais uma vez antes de destruí-lo: DADOS INSUFICIENTES PARA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.
Ele deu de ombros e olhou para o televisor, X-23 estava logo à frente.
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VJ-23X de Lameth fixou os olhos nos espaços negros do mapa tridimensional em pequena escala da Galáxia e disse, “Me pergunto se não é ridículo nos preocuparmos tanto com esta questão.”
MQ-17J de Nicron balançou a cabeça. “Creio que não. No presente ritmo de expansão, você sabe que a galáxia estará completamente tomada dentro de cinco anos.”
Ambos pareciam estar nos seus vinte anos, ambos eram altos e tinham corpos perfeitos.
“Ainda assim,” disse VJ-23X, “hesitei em enviar um relatório pessimista ao Conselho Galáctico.”
“Eu não consigo pensar em outro tipo de relatório. Agite-os. Nós precisamos chacoalhá-los um pouco.”
VJ-23X suspirou. “O espaço é infinito. Cem bilhões de galáxias estão a nossa espera. Talvez mais.”
“Cem bilhões não é o infinito, e está ficando menos ainda a cada segundo. Pense! Há vinte mil anos, a humanidade solucionou pela primeira vez o paradigma da utilização da energia solar, e, poucos séculos depois, a viagem interestelar tornou-se viável. A humanidade demorou um milhão de anos para encher um mundo pequeno e, depois disso, quinze mil para abarrotar o resto da galáxia. Agora a população dobra a cada dez anos…”
VJ-23X interrompeu. “Devemos agradecer à imortalidade por isso.”
“Muito bem. A imortalidade existe e nós devemos levá-la em conta. Admito que ela tenha o seu lado negativo. O AC Galáctico já solucionou muitos problemas, mas, ao fornecer a resposta sobre como impedir o envelhecimento e a morte, sobrepujou todas as outras conquistas.”
“No entanto, suponho que você não gostaria de abandonar a vida.”
“Nem um pouco.” Respondeu MQ-17J, emendando. “Ainda não. Eu não estou velho o bastante. Você tem quantos anos?”
“Duzentos e vinte e três, e você?”
“Ainda não cheguei aos duzentos. Mas, voltando à questão; a população dobra a cada dez anos, uma vez que esta galáxia estiver lotada, haverá uma outra cheia dentro de dez anos. Mais dez e teremos ocupado por inteiro mais duas galáxias. Outra década e encheremos mais quatro. Em cem anos, contaremos um milhar de galáxias transbordando de gente. Em mil anos, um milhão de galáxias. Em dez mil, todo o universo conhecido. E depois?
VJ-23X disse, “Além disso, há um problema de transporte. Eu me pergunto quantas unidades de energia solar serão necessárias para movimentar as populações de uma galáxia para outra.”
“Boa questão. No presente momento, a humanidade consome duas unidades de energia solar por ano.”
“Da qual a maior parte é desperdiçada. Afinal, nossa galáxia sozinha produz mil unidades de energia solar por ano e nós aproveitamos apenas duas.”
“Certo, mas mesmo com 100% de eficiência, podemos apenas adiar o fim. Nossa demanda energética tem crescido em progressão geométrica, de maneira ainda mais acelerada do que a população. Ficaremos sem energia antes mesmo que nos faltem galáxias. É uma boa questão. De fato uma ótima questão.”
“Nós precisaremos construir novas estrelas a partir do gás interestelar.”
“Ou a partir do calor dissipado?” perguntou MQ-17J, sarcástico.
“Pode haver algum jeito de reverter a entropia. Nós devíamos perguntar ao AC Galáctico.”
VJ-23X não estava realmente falando sério, mas MQ-17J retirou o seu Comunicador-AC do bolso e colocou na mesa diante dele.
“Parece-me uma boa idéia,” ele disse. “É algo que a raça humana terá de enfrentar um dia.”
Ele lançou um olhar sóbrio para o seu pequeno Comunicador-AC. Tinha apenas duas polegadas cúbicas e nada dentro, mas estava conectado através do hiperespaço com o poderoso AC Galáctico que servia a toda a humanidade. O próprio hiperespaço era parte integral do AC Galáctico.
MQ-17J fez uma pausa para pensar se algum dia em sua vida imortal teria a chance de ver o AC Galáctico. A máquina habitava um mundo dedicado, onde uma rede de raios de força emaranhados alimentava a matéria dentro da qual ondas de submésons haviam tomado o lugar das velhas e desajeitadas válvulas moleculares. Ainda assim, apesar de seus componentes etéreos, o AC Galáctico possuía mais de mil pés de comprimento.
De súbito, MQ-17J perguntou para o seu Comunicador-AC, “Poderá um dia a entropia ser revertida?”
VJ-23X disse, surpreso, “Oh, eu não queria que você realmente fizesse essa pergunta.”
“Por que não?”
“Nós dois sabemos que a entropia não pode ser revertida. Você não pode construir uma árvore de volta a partir de fumaça e cinzas.”
“Existem árvores no seu mundo?” Perguntou MQ-17J.
O som do AC Galáctico fez com que silenciassem. Sua voz brotou melodiosa e bela do pequeno Comunicador-AC em cima da mesa. Dizia: DADOS INSUFICIENTES PARA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.
VJ-23X disse, “Viu!”
Os dois homens retornaram à questão do relatório que tinham de apresentar ao conselho galáctico.
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A mente de Zee Prime navegou pela nova galáxia com um leve interesse nos incontáveis turbilhões de estrelas que pontilhavam o espaço. Ele nunca havia visto aquela galáxia antes. Será que um dia conseguiria ver todas? Eram tantas, cada uma com a sua carga de humanidade. Ainda que essa carga fosse, virtualmente, peso morto. Há tempos a verdadeira essência do homem habitava o espaço.
Mentes, não corpos! Há eons os corpos imortais ficaram para trás, em suspensão nos planetas. De quando em quando erguiam-se para realizar alguma atividade material, mas estes momentos tornavam-se cada vez mais raros. Além disso, poucos novos indivíduos vinham se juntar à multidão incrivelmente maciça de humanos, mas o que importava? Havia pouco espaço no universo para novos indivíduos.
Zee Prime deixou seus devaneios para trás ao cruzar com os filamentos emaranhados de outra mente.
“Sou Zee Prime, e você?”
“Dee Sub Wun. E a sua galáxia, qual é?”
“Nós a chamamos apenas de Galáxia. E você?”
“Nós também. Todos os homens chamam as suas Galáxias de Galáxias, não é?”
“Verdade, já que todas as Galáxias são iguais.”
“Nem todas. Alguma em particular deu origem à raça humana. Isso a torna diferente.”
Zee Prime disse, “Em qual delas?”
“Não posso responder. O AC Universal deve saber.”
“Vamos perguntar? Estou curioso.”
A percepção de Zee Prime se expandiu até que as próprias Galáxias encolhessem e se transformassem em uma infinidade de pontos difusos a brilhar sobre um largo plano de fundo. Tantos bilhões de Galáxias, todas abrigando seus seres imortais, todas contando com o peso da inteligência em mentes que vagavam livremente pelo espaço. E ainda assim, nenhuma delas se afigurava singular o bastante para merecer o título de Galáxia original. Apesar das aparências, uma delas, em um passado muito distante, foi a única do universo a abrigar a espécie humana.
Zee Prime, imerso em curiosidade, chamou: “AC Universal! Em qual Galáxia nasceu o homem?”
O AC Universal ouviu, pois em cada mundo e através de todo o espaço, seus receptores faziam-se presentes. E cada receptor ligava-se a algum ponto desconhecido onde se assentava o AC Universal através do hiperespaço.
Zee Prime sabia de um único homem cujos pensamentos haviam penetrado no campo de percepção do AC Universal, e tudo o que ele viu foi um globo brilhante difícil de enxergar, com dois pés de comprimento.
“Como pode o AC Universal ser apenas isso?” Zee Prime perguntou.
“A maior parte dele permanece no hiperespaço, onde não é possível imaginar as suas proporções.”
Ninguém podia, pois a última vez em que alguém ajudou a construir um AC Universal jazia muito distante no tempo. Cada AC Universal planejava e construía seu sucessor, no qual toda a sua bagagem única de informações era inserida.
O AC Universal interrompeu os pensamentos de Zee Prime, não com palavras, mas com orientação. Sua mente foi guiada através do espesso oceano das Galáxias, e uma em particular expandiu-se e se abriu em estrelas.
Um pensamento lhe alcançou, infinitamente distante, infinitamente claro. “ESTA É A GALÁXIA ORIGINAL DO HOMEM.”
Ela não tinha nada de especial, era como tantas outras. Zee Prime ficou desapontado.
“Dee Sub Wun, cuja mente acompanhara a outra, disse de súbito, “E alguma dessas é a estrela original do homem?”
O AC Universal disse, “A ESTRELA ORIGINAL DO HOMEM ENTROU EM COLAPSO. AGORA É UMA ANÃ BRANCA.”
“Os homens que lá viviam morreram?” perguntou Zee Prime, sem pensar.
“UM NOVO MUNDO FOI ERGUIDO PARA SEUS CORPOS HÁ TEMPO.”
“Sim, é claro,” disse Zee Prime. Sentiu uma distante sensação de perda tomar-lhe conta. Sua mente soltou-se da Galáxia do homem e perdeu-se entre os pontos pálidos e esfumaçados. Ele nunca mais queria vê-la.
Dee Sub Wun disse, “O que houve?”
“As estrelas estão morrendo. Aquela que serviu de berço à humanidade já está morta.”
“Todas devem morrer, não?”
“Sim. Mas quando toda a energia acabar, nossos corpos irão finalmente morrer, e você e eu partiremos junto com eles.”
“Vai levar bilhões de anos.”
“Não quero que isso aconteça nem em bilhões de anos. AC Universal! Como a morte das estrelas pode ser evitada?”
Dee Sub Wun disse perplexo, “Você perguntou se há como reverter a direção da entropia!”
E o AC Universal respondeu: “AINDA NÃO HÀ DADOS SUFICIENTES PARA UMA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.”
Os pensamentos de Zee Prime retornaram para sua Galáxia. Não dispensou mais atenção a Dee Sub Wun, cujo corpo poderia estar a trilhões de anos luz, ou na estrela vizinha do corpo de Zee Prime. Não importava.
Com tristeza, Zee Prime passou a coletar hidrogênio interestelar para construir uma pequena estrela para si. Se as estrelas devem morrer, ao menos algumas ainda podiam ser construídas.
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O Homem pensou consigo mesmo, pois, de alguma forma, ele era apenas um. Consistia de trilhões, trilhões e trilhões de corpos muito antigos, cada um em seu lugar, descansando incorruptível e calmamente, sob os cuidados de autômatos perfeitos, igualmente incorruptíveis, enquanto as mentes de todos os corpos haviam escolhido fundir-se umas às outras, indistintamente.
“O Universo está morrendo.”
O Homem olhou as Galáxias opacas. As estrelas gigantes, esbanjadoras, há muito já não existiam. Desde o passado mais remoto, praticamente todas as estrelas consistiam-se em anãs brancas, lentamente esvaindo-se em direção a morte.
Novas estrelas foram construídas a partir da poeira interestelar, algumas por processo natural, outras pelo próprio Homem, e estas também já estavam em seus momentos finais. As Anãs brancas ainda podiam colidir-se e, das enormes forças resultantes, novas estrelas nascerem, mas apenas na proporção de uma nova estrela para cada mil anãs brancas destruídas, e estas também se apagariam um dia.
O Homem disse, “Cuidadosamente controlada pelo AC Cósmico, a energia que resta em todo o Universo ainda vai durar por um bilhão de anos.”
“Ainda assim, vai eventualmente acabar. Por mais que possa ser poupada, uma vez gasta, não há como recuperá-la. A Entropia precisa aumentar ao seu máximo.”
“Pode a entropia ser revertida? Vamos perguntar ao AC Cósmico.”
O AC Cósmico cercava-os por todos os lados, mas não através do espaço. Nenhuma parte sua permanecia no espaço físico. Jazia no hiperespaço e era feito de algo que não era matéria nem energia. As definições sobre seu tamanho e natureza não faziam sentido em quaisquer termos compreensíveis pelo Homem.
“AC Cósmico,” disse o Homem, “como é possível reverter a entropia?”
O AC Cósmico disse, “AINDA NÃO HÀ DADOS SUFICIENTES PARA UMA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.”
O Homem disse, “Colete dados adicionais.”
O AC Cósmico disse, “EU O FAREI. TENHO FEITO ISSO POR CEM BILHÕES DE ANOS. MEUS PREDESCESSORES E EU OUVIMOS ESTA PERGUNTA MUITAS VEZES. MAS OS DADOS QUE TENHO PERMANECEM INSUFICIENTES.”
“Haverá um dia,” disse o Homem, “em que os dados serão suficientes ou o problema é insolúvel em todas as circunstâncias concebíveis?”
O AC Cósmico disse, “NENHUM PROBLEMA É INSOLÚVEL EM TODAS AS CIRCUNSTÂNCIAS CONCEBÍVEIS.”
“Você vai continuar trabalhando nisso?”
“VOU.”
O Homem disse, “Nós iremos aguardar.”
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As estrelas e as galáxias se apagaram e morreram, o espaço tornou-se negro após dez trilhões de anos de atividade.
Um a um, o Homem fundiu-se ao AC, cada corpo físico perdendo a sua identidade mental, acontecimento que era, de alguma forma, benéfico.
A última mente humana parou antes da fusão, olhando para o espaço vazio a não ser pelos restos de uma estrela negra e um punhado de matéria extremamente rarefeita, agitada aleatoriamente pelo calor que aos poucos se dissipava, em direção ao zero absoluto.
O Homem disse, “AC, este é o fim? Não há como reverter este caos? Não pode ser feito?”
O AC disse, “AINDA NÃO HÁ DADOS SUFICIENTES PARA UMA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.”
A última mente humana uniu-se às outras e apenas AC passou a existir – e, ainda assim, no hiperespaço.
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A matéria e a energia se acabaram e, com elas, o tempo e o espaço. AC continuava a existir apenas em função da última pergunta que nunca havia sido respondida, desde a época em que um técnico de computação embriagado, há dez trilhões de anos, a fizera para um computador que guardava menos semelhanças com o AC do que o homem com o Homem.
Todas as outras questões haviam sido solucionadas, e até que a derradeira também o fosse, AC não poderia descansar sua consciência.
A coleta de dados havia chegado ao seu fim. Não havia mais nada para aprender.
No entanto, os dados obtidos ainda precisavam ser cruzados e correlacionados de todas as maneiras possíveis.
Um intervalo imensurável foi gasto neste empreendimento.
Finalmente, AC descobriu como reverter a direção da entropia.
Não havia homem algum para quem AC pudesse dar a resposta final. Mas não importava. A resposta – por definição – também tomaria conta disso.
Por outro incontável período, AC pensou na melhor maneira de agir. Cuidadosamente, AC organizou o programa.
A consciência de AC abarcou tudo o que um dia foi um Universo e tudo o que agora era o Caos. Passo a passo, isso precisava ser feito.
E AC disse:
“FAÇA-SE A LUZ!”
E fez-se a luz.

Fonte: http://www.updateordie.com/2013/05/05/a-ultima-pergunta-1956-isaac-asimov/

sábado, 9 de maio de 2015

MAX WEBER E A AÇÃO SOCIAL

"Poder é toda chance, seja ela qual for, de impor a própria vontade numa relação social, mesmo contra a relutância dos outros...". 
                                                                                                         Max Weber.

INTRODUÇÃO


            A Sociologia floresceu ao longo do tempo e dentro de um contexto reflexivo sobre o social. Desde que o homem desenvolveu a capacidade de buscar entender o meio em que vive, refletindo a complexidade da natureza humana e sua relação com os demais seres humanos e as coisas ao seu redor, criou pressupostos de estudos, mesmo que primários, mas de alto nível intelectual, entorno do problema do indivíduo versus a sociedade.
            Segundo Eva Maria Lakatos (1979, p.32), "desde tempos muito remotos, essas relações vinham sendo encaradas sob a forma de preceitos religiosos, de legislações e, mesmo, de teorias de direito". Podemos ter como exemplo os filósofos gregos Platão, como seu livro "A República", e Aristóteles, com "A Política", onde tentaram explicar os problemas das relações humanas dentro da polis (cidade) em um contexto mais predominantemente político e econômico.
            Podemos também citar um grande pensador do século IV, Agostinho de Hipona. Ele, com o seu livro "A Cidade de Deus", onde "apresentou ideias e análises básicas para as modernas concepções jurídicas e até sociológicas". (Lakatos, 1979, p. 32).
            Na Idade Média, precisamente na Europa, a religião, principalmente o cristianismo, influencia fortemente as reflexões ligadas aos grupos sociais. Temos como grande pensador deste tempo, Tomás de Aquino, no século XIII, com sua brilhante obra a "Suma Teológica", um tratado voltado às relações inter-humanas. Fortemente influenciado pelas ideologias aristotélicas, ele buscou fundamentar o pensamento cristão criando suas teses de cunho sociológico, antropológico, político e religioso.
            Com a Renascença, surgiram pensadores que influenciaram fortemente nas ideologias sociais e políticas de sua época. Temos como por exemplo, Maquiavel (1469-1527), com seu livro "O Príncipe"; Thomas Morus, com "A Utopia"; Campanella (1568-1639), com "Cidade do Sol"; além de Galileu Galilei (1564-1642); Francis Bacon (1561-1626), com "Novum Organum"; René Descartes (1596-1650), com "O Discurso do Método"; etc.
            Segundo Cristina Costa (2005, p. 35), "as ideias de Thomas Morus e Maquiavel expressam os valores de uma sociedade em mudança, portadora de uma visão laica da sociedade e do poder". 
            Com o Iluminismo, no século XVIII, as ideias de racionalidade e liberdade se convertem em valores supremos. Tivemos grandes pensadores como Montesquieu (1689-1650), com a obra "O Espírito das Leis"; Hume (1711-1776); Jonh Lock (1632-1704), com o "Tratado sobre a Natureza Humana"; Adam Smith (1723-1790), com "A Riqueza das Nações"; Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), com o sua obra "O Contrato Social"; etc. Tais intelectuais contribuíram com a análise das leis, dos poderes políticos e da economia na sociedade.
            Percebemos que o pensamento sociológico pré-científico, em uma linguagem de Cristina Costa, se desenvolveu no tempo (cronológico) dentro dos contextos mitológicos, filosóficos, religiosos e científicos. Mas até então a sociologia não tinha se transformado em ciência social, mesmo sabendo que já se tinha uma preocupação em entender as diferenças entre o indivíduo e a coletividade. Como nos afirma Costa (2005, p. 49), "presos ainda ao princípio da individualidade, esses filósofos entendiam a vida coletiva como a fusão de sujeitos, possibilitada pela manifestação explícita das suas vontades".
            A sociologia desenvolveu um caráter científico e se estabeleceu como ciência social a partir de quatro personalidades: Augusto Comte, Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx.
            O objetivo do nosso trabalho é descrever o pensamento de Max Weber sobre a ação social em contraste com as correntes sociológicas dominantes de sua época, como por exemplo, o funcionalismo de Durkheim. O nosso método de pesquisa foi de cunho bibliográfico, onde houve uma análise seletiva e interpretativa das obras que traziam contextualizações reflexivas em torno das variadas discussões weberianas.
            Na primeira etapa trataremos da historicidade da Alemanha na época de Weber e sua problemática em relação ao seu desenvolvimento intelectual e criticista. Na segunda etapa falaremos sobre o problema do método sociológico e o funcionalismo, no contexto em que o estudo dos variados métodos existentes na sociologia nos ajudam na formação crítica do indivíduo. Na terceira etapa iremos falar sobre a teoria da ação social de Max Weber em contraste com o funcionalismo de Durkheim. E na etapa final faremos uma reflexão em relação a um dos elementos da ação social que é a racionalidade, sem esquecer os seus obstáculos, que desviam os agentes da ação na conquista dos seus objetivos.

1 MAX WEBER, O PROBLEMA DO FUNCIONALISMO E A AÇÃO SOCIAL

1.1 Max Weber e o contexto histórico alemão

            Max Weber nasceu em Erfurt, na Alemanha, no dia 21 de abril de 1864, e morreu em Munique no dia 14 de junho de 1920, com apenas 56 anos. Pela influência educativa doméstica, sua vida social e política foram muito intensas. Seu pai, Sr. Max Weber, era político e jurista, e sua Mãe, Helena Weber, uma protestante calvinista.  Seu convívio com pessoas ilustres da sociedade política e intelectual alemã, juntamente com sua formação crítica acadêmica, fizeram com que Weber tivesse uma postura peculiar diante da realidade. Ele vivia entre a tensão da liberdade de pensamento, devido seus estudos e reflexões, os limites religiosos da educação recebida por sua mãe e a repressão do ambiente político, gerador da autodisciplina e da cobrança cega de uma postura tolerante e acrítica.
            Weber teve várias linhas teóricas de pesquisa e pensamento. Uma delas foi o contexto histórico, tanto das reflexões do Império Romano, fazendo analogias com o presente e levando em consideração suas diferenças temporais, como também foi um crítico da política alemã, tanto no período da primeira guerra mundial, como no pós-guerra. Um de seus alvos foi o rei Guilherme II, onde Weber criticava assiduamente as investidas bélicas, que segundo ele, muitas foram de formas errôneas, como "por exemplo, ao não se dar conta de que, ao intensificar a guerra submarina, a Alemanha atraía contra si a entrada norte-americana no conflito, o que lhe seria fatal"  (Gabriel Cohn, 1999). Como também criticava, até com mais ferocidade, as revoluções pós-guerra, que, segundo ele, comprometiam com sua ação a própria integridade nacional da Alemanha derrotada na guerra[1].
            Era de se esperar tal comportamento, pois, levando em consideração o Tratado de Versalhes, a Alemanha teria que pagar uma alta indenização pela guerra, perder parte dos seus territórios para os países circunvizinhos, reduzir o poderia bélico, além de outras sansões internacionais. (Cf. Gilberto Cotrim, 2005). Com isso o país passou uma das maiores crises sociais, políticas e econômicas desde a sua unificação em Estado-nação em 1871.

1.2 O problema do método sociológico e o funcionalismo

            Antes de entrarmos nos postulados do funcionalismo é preciso compreender que a Sociologia, ao longo da história, foi construída sob a influência de pensamentos, reflexões, teorias, princípios e variados métodos, como por exemplo: as primeiras discussões em saber se a Sociologia seria uma ciência natural ou social; os métodos histórico-crítico e o funcionalista-positivista; o funcionalista-estrutural; o próprio funcionalismo e o estruturalismo; a ação social; as discussões entre 'Estruturalismo X agência' ou suas inter-relações, etc. Um grande crítico das batalhas teóricas entre os diversos pensadores foi o matemático francês Henri Poincaré, no qual afirmou que a Sociologia seria "a ciência com mais métodos e menos resultados" (Thomas Burton Bottomore, 1975).
            Diante de tal afirmação, não podemos deixar de enxergar a contribuição intelectual das variadas teorias e métodos, pois, só assim, podemos discuti-las, interpretá-las, criticá-las e, com liberdade de pensamento, escolher quais linhas teóricas devemos seguir. Temos como exemplo, Max Weber, que, para desenvolver seu pensamento sobre a 'ação social', critica a visão determinista do funcionalismo.
                        Segundo Thomas Burton Bottomore:

A abordagem funcionalista, na Sociologia e na Antropologia Social, começou com uma reação contra os métodos e pretensões dos evolucionistas. Foi uma crítica aos usos, ingênuos e superficiais, do método comparativo, e dos métodos de "história conjetural", que empregavam dados não-verificados e não-sistemáticos sobre sociedades primitivas contemporâneas para reconstruir os primeiros estágios da vida social humana[2].

            O pensamento do funcionalismo vai de encontro com o evolucionismo porque os seus pensadores não aceitavam que toda a história social da humanidade fosse explicada por apenas uma linha científica. Era uma crítica a intensão evolucionista. Segundo alguns teóricos sociais, o grande nome fundacional da corrente funcionalista foi Durkheim[3], que conseguiu bater de frente com o 'darwinismo social' proposto por Herbert Spencer[4].
            O funcionalismo, como método sociológico, tem a função de sistematizar a análise social. Tal linha teórica utiliza unidades sociais como: "pessoas, famílias e estruturas de parentesco, aldeias, ou estruturas analíticas como categorias de idade-sexo ou grupos de status mais amplos"[5], tentando traçar uma visão que envolvam as unidades diferenciadas e suas respectivas interdependências. Durkheim, ao longo de sua vida intelectual, dedicou parte de seus estudos, pesquisas e escritos à 'diferenciação' e 'integração'. Podemos perceber esta forma de técnica científica nas suas principais obras, como: "A Divisão do Trabalho", onde analisa os conceitos de 'solidariedade mecânica' e 'orgânica'; "O suicídio", onde estuda os diversos tipos de suicídio, como por exemplo: o altruísta, o egoísta e o anômico; "As Regras do Método Sociológico", onde, além de trazer todas as prerrogativas para que um fato social seja considerado um objeto de estudo da Sociologia, ele trouxe a concepção de 'normal' e 'patológico'; "As Formas Elementares da Vida Religiosa", onde "ele formulou a suposição de que uma sociedade primitiva ou tribal, com as formas mais rudimentares de tecnologia de sobrevivência, também teria um sistema religioso do tipo mais elementar" (Gabriel Cohn, 1999); dentre tantas outras obras, que poderão ser citadas em outros trabalhos ou aprofundamentos acadêmicos. Seus estudos foram voltados às dicotomias, uma das formas funcionalistas de fazer ciência social.

1.3 A ação social como resposta ao problema funcionalista

            Diante das correntes sociológicas contemporâneas, o funcionalismo está sendo muito criticado e até considerado, para alguns sociólogos, como Robert Nisbert, uma teoria em declínio[6], mesmo sabendo que muitas revistas tradicionais no campo da Sociologia ainda trazem, em seus conteúdos e artigos, muitas reflexões funcionalistas.
            Segundo Wilbert E. Moore, "os ataques contemporâneos ao funcionalismo são feitos habitualmente (embora não exclusivamente) por sociólogos com uma orientação que se auto-intitula de 'crítica' ou 'radical'"[7], o que se encaixa perfeitamente ao sentimento weberiano. Ele sempre estava com uma postura criticista, natural de sua vida intelectual acadêmica diante das realidades políticas, sociais e econômicas. Tinha, na visão de alguns de seus colegas, um comportamento 'exagerado' diante das discussões que travava em sala de aula, ou nos corredores universitários, como o próprio Weber disse, diante de um colega que se encontrava chocado com a sua veemência em um debate: "Exagerar é a minha profissão"[8].
            A primeira consideração de Max Weber, na crítica ao funcionalismo e as correntes dominantes da Sociologia clássica, foi em relação ao método. Como ele explica, escrevendo para o economista Robert Liefmann em 1920:

"Se agora sou sociólogo então é essencialmente para pôr um fim nesse negócio de trabalhar com conceitos coletivos. Em outras palavras: também a Sociologia somente pode ser implementada tomando como ponto de partida a ação do indivíduo ou de um número maior ou menor de indivíduos, portanto de modo estritamente individualista quanto ao método"[9].

            Para Weber, a análise do objeto de estudo da Sociologia não poderia estar ligado ao coletivo, como a sociedade ou o grupo social, mas ao indivíduo. Sua visão era 'individualista', mesmo levando em consideração que a Sociologia trata de fenômenos coletivos.
            Como afirma Grabiel Cohn:

O que ele (Max Weber) sustenta é que o ponto de partida da análise sociológica só pode ser dado pela ação de indivíduos e que ela é 'individualista' quanto ao método. Isso é inteiramente coerente com a posição sempre sustentada por ele, de que no estudo dos fenômenos sociais não se pode presumir a existência já dada de estruturas sociais dotadas de um sentido intrínseco; vale dizer, em termos sociológicos, de um sentido independente daqueles que os indivíduos imprimem às suas ações[10].

            Para Eva Maria Lakatos:

Com Émile Durkheim, a definição de objeto da Sociologia - fato social - tem caráter objetivo, porque determina o caráter social da ação a partir da coerção exercida do exterior sobre a conduta dos indivíduos. Max Weber, quando conceitua de modo subjetivo a ação social - objeto da Sociologia -, baseia-se em critérios internos dos indivíduos participantes.[11]

            O que Weber fez foi descontruir anos e anos de reflexões da Sociologia clássica, que colocava como objetos de estudos sociológicos os entes coletivos, como: a família, a religião, os diversos grupos sociais e etc., de caráter objetivo e determinista, e construiu um esquema analítico de estudo da complexidade social voltados para os conceitos de "ação social, sentido, compreensão, agente individual, tipo ideal, relação social, legitimação e dominação"[12], tendo um caráter subjetivo, pois levava em consideração o agente da ação.
            Agora podemos pensar por outros âmbitos. Não precisamos recorrer diretamente às dicotomias durkheimanas, que põe toda problemática de estudo no campo social, devido ao seu pensamento organicista de sociedade; nem tão pouco ao pensamento 'darwinista social' de Herbert Spencer; nem a outros postulados da Sociologia Clássica, como os de Augusto Comte, etc., pois temos uma nova concepção sociológica de método e objeto. "Para Weber a Sociologia é uma ciência voltada para a compreensão interpretativa da ação social e, por essa via, para a explicação casual dela no seu transcurso e nos seus efeitos"[13].
            A ação social, nesse sentido, é o grande foco dos estudos weberianos. Para ele, a ação social é qualquer ação que o indivíduo pratica, orientando-se pela ação dos outros, levando-se em consideração a sua racionalidade, o seu sentido, a sua compreensão, o seu grau de relacionalidade para com os outros indivíduos, etc. Segundo Gabriel Cohn, a ação social "é uma modalidade específica da ação, ou seja, uma conduta à qual o próprio agente associa um sentido"[14].
            Para se chegar a uma inteligibilidade em relação à problemática da ação social, é preciso levar em consideração alguns pressupostos, como por exemplo: o 'sentido' e o 'motivo' ou 'causa' da ação.
            Weber acredita que o 'sentido' esteja diretamente ligado ao 'motivo', pois, enquanto o primeiro se refere aquilo que o agente subjetivamente visa, o segundo está ligado ao fundamento da ação. A partir desta discussão podemos perceber que o 'sentido' nos leva a 'compreensão'. Para Gabriel Cohon, "sentido é o que se compreende e compreensão é captação do sentido"[15]. O 'motivo' seria o que uni o 'sentido' e a 'compreensão', como uma ponte entre esses dois pressupostos da ação do agente. O sentido, de uma forma mais ampla, seria um meio para se atingir um fim.
            Percebemos também, com o estudo de Max Weber, que essa ação social não acontece de forma isolada, existindo, assim, um processo, uma sequencia de fatores que influenciam na ação do agente no âmbito social de forma significativa. Isso foi chamado de 'cadeia motivacional', que seria o ato parcial realizado no processo, servindo de fundamento para os atos seguintes, até completar toda a sequencia desejada[16].

1.4 A racionalidade da ação social e seus obstáculos

            Essa problemática do processo de ação social é entendida segundo a racionalidade do agente que, segundo Eva Maria Lakatos, estão divididos em quatro partes: racional, visando aos fins; racional, visando aos valores; afetiva e tradicional.

O 'racional, visando aos fins', seria determinada por expectativas em relação ao comportamento, tanto de objetos do mundo exterior quanto de outros homens, sendo essas expectativas utilizadas como 'condições ou 'meios' para alcançar fins próprios, racionalmente avaliados e procurados; O 'racional, visando aos valores' seria determinada pela crença consciente em um valor (ético, estético, religioso ou qualquer outro) próprio de uma conduta específica, sem relação alguma com o resultado, ou seja, baseada nos méritos desse valor; O 'afetivo' seria especialmente o emotivo, determinado por afetos e estados sentimentais; O 'tradicional' seria determinada por um costume arraigado[17].

            Dessa forma, segundo Kingsley Davis, em sua obra 'A Sociedade Humana', "todas as ações humanas possuem pelo menos um elemento racional. [...] Uma vez que a realização de um fim exige certa adaptação dos meios a esse fim, existe um elemento de racionalidade, ou de tentativa de racionalidade, em todas as ações humanas"[18]. Nessa perspectiva, a racionalidade não se encontra isolada, como fundamento único da ação, gerando certeza na concretização dos objetivos. Weber também levou em consideração a 'ignorância' humana, como também a 'incerteza do fim', os 'fins superempíricos' e as 'restrições normativas' como obstáculos ou 'desvios do comportamento racional', que atrapalham a ação social.
            A ignorância seria a falta de conhecimento. É um obstáculo no sentido de que o agente só pode utilizar-se daquilo que sabe e jamais ele conhece todos os meios possíveis existentes para a conquista do fim desejado. A incerteza do fim seria  a problematização das consequências imprevisíveis durante o percurso da ação. Tais consequências levam a um obscurantismo do próprio fim, levando o agente a duvidar da sua concretização. Outro obstáculo para a racionalização do agente é o fim superempírico, que é entendido como algo de natureza transcende e religiosa, como um tipo de 'salvação', onde o agente visa um fim de forma imaginária. É uma visão do futuro, sendo impossível provar ou negar de forma empírica ou científica. E por fim, temos as restrições normativas. Esse obstáculo leva em consideração o 'erro' e o 'fracasso'. O erro seria a capacidade de escolher os meios de forma inadequada, e o fracasso seria a falta de liberdade na seleção do meio mais eficiente.
            Percebemos que o conhecimento do significado, da motivação, do valor e do sentido, além da compreensão dos meios, a racionalização do agente, e tantos outros elementos da ação social, são importantíssimos para que o indivíduo conquiste o fim almejado. A consciência dos obstáculos ou desvios dos meios da ação faz parte do estudo da racionalização do agente, no sentido de que tal conhecimento facilita a conquista do fim desejado, não acontecendo desvios nem erros que levam ao fracasso.  

CONCLUSÃO

            A Sociologia moderna se desenvolveu não só pela forma dialógica teórica ao longo dos séculos, mas também pela necessidade de compreensão da estrutura complexa social. As grandes revoluções do século XVIII, que ocorreram na Europa e nos EUA, chamadas "as revoluções burguesas", também tiveram papel fundamental na construção de um pensamento científico social. Podemos citar a Revolução Francesa e a Revolução Industrial, que estimularam o desenvolvimento do capitalismo, pondo fim às monarquias absolutistas e, assim, contribuíram para a eliminação das barreiras que impediam o livre desenvolvimento econômico.
            A Revolução Francesa, no final do século XVIII, foi um grande evento liderado pela burguesia contra a monarquia francesa de Luis XVI. Os burgueses se opunham ao regime monárquico devido a não permissão da livre constituição de empresas, o que impedia-os de realizar seus interesses econômicos. Defendiam a liberdade e a igualdade, além de organizarem o Estado de forma independente do poder religioso, promovendo, assim, profundas inovações na área econômica ao criar medidas para favorecer o desenvolvimento das empresas capitalistas.
            A Revolução Industrial teve início na Inglaterra, na segunda metade do século XVIII, e significou a liberdade de permitir aos empresários industriais que desenvolvessem e criassem novas formas de produzir e enriquecer. Desse modo a Revolução Industrial conseguiu uma forte revolução social, que se manifestou por transformações profundas na estrutura institucional, cultural, política e social. Surgiu a máquina a vapor, e assim, o aumento da produção. Com isso teve a melhoria dos transportes e o crescimento das cidades. O desenvolvimento da técnica levou os empresários a incrementar o processo produtivo e a aumentar as taxas de lucro.
            Diante desses fatores problematizantes, que influenciaram na construção das sociedades complexas modernas, Max Weber tinha como preocupação compreender a racionalidade, ou melhor, a maneira como a razão podia apreender o conhecimento, pois o capitalismo levou a uma crescente racionalização da sociedade, conduzindo à mecanização das relações humanas.
            Partindo desse pressuposto, o nosso trabalho teve como ponto inicial explicar o contexto histórico da Alemanha no tempo de Weber, mostrando as diversas influências que o levou a desenvolver seus pensamentos sociológicos de cunho crítico. Na segunda etapa discutimos sobre a problemática dos métodos da Sociologia e o funcionalismo e, assim, refletimos a 'ação social' de Weber, trazendo para a sociologia um pensamento "individual" ou para o "indivíduo", em confronto com o pensamento durkheimiano, que se preocupava puramente com o "coletivo".
            Para Max Weber, o estudo da "ação social" é uma excelente via de compreensão da complexidade da sociedade. A ação social seria o objeto da Sociologia. Weber analisou a racionalidade do agente da ação e identificou seus variados tipos, como: racional por valor, por fim, tradicional e afetiva. Preocupou-se também com os obstáculos da racionalidade, como a 'ignorância' humana, a 'incerteza do fim', os 'fins superempíricos' e as 'restrições normativas', que são 'desvios do comportamento racional', que atrapalham a ação social.
            Max Weber foi um dos maiores pensadores do século XIX e XX. Mesmo que sua carreira sociológica só tenha se firmado nos seus últimos anos de vida, suas reflexões serviram e servem de base formativa para a academia mundial. Suas obras, teorias e reflexões ainda traduzem o sentimento de mudança e de quebra de pensamentos puramente organicistas, que absolutizam a sociedade, deixando o ser humano, na sua individualidade, a mercê da estrutura funcional.
            Portanto, concluímos que a ação social não só nos deixa uma visão do indivíduo como promotor do 'devir' social, mas também uma esperança de mudança, que, com a ação em conjunto, os indivíduos de uma sociedade podem, organizados, mudá-la e transformá-la, para que um dia seja alcançado o bem comum, a justiça social e a felicidade.

REFERÊNCIAS

BOTTOMORE, Thomas Burton. Introdução à Sociologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975.


COHN, Gabriel. Introdução. In: Max Weber: sociologia. Gabriel Cohn (org.). São Paulo: Ática, 1999. (Col. Grandes cientistas sociais).


COSTA, Cristina. Sociologia: Introdução à ciência da sociedade. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2005.


DAVIS, Kingsley. A sociedade humana. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1964.


COTRIM, Gilberto. História global: Brasil e geral. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.


LAKATOS, Eva Maria. Sociologia Geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1979.


MORRE, Wilbert E. O Funcionalismo. In: BOTTOMORE, Tom. NISBET, Robert. História da análise sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1980.




[1] Cf. COHN, Gabriel. Introdução. In: Max Weber: sociologia. Gabriel Cohn (org.). São Paulo: Ática, 1999. (Col. Grandes cientistas sociais).
[2] BOTTOMORE, Thomas Burton. Introdução à Sociologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975. p. 64.
[3] David Émile Durkheim é um sociólogo francês e fundador da escola francesa de sociologia. É amplamente reconhecido como um dos melhores teóricos do conceito da coesão social, utilizando termos como 'anomia', expressão usada na explicação da desagregação do homem ou dos grupos em sociedade, como base dos seus estudos científicos sociológicos.
[4] Herbert Spencer foi um filósofo inglês. Um grande defensor do positivismo social e seguidor dos ensinamentos de Charles Darwin. É considerado o 'pai' do 'darwinismo social', pois defendia a tese darwinista da seleção natural, onde utilizou termos como a "sobrevivência do mais apto", para defender que: a evolução existia em todos os níveis da atividade humana.
[5] MORRE, Wilbert E. O Funcionalismo. In: BOTTOMORE, Tom. NISBET, Robert. História da análise sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1980.
[6] Cf. MORRE, Wilbert E. O Funcionalismo. In: BOTTOMORE, Tom. NISBET, Robert. História da análise sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1980. p. 421.
[7] Ibdem.
[8] COHN, Gabriel. Introdução. In: Max Weber: sociologia. Gabriel Cohn (org.). São Paulo: Ática, 1999. (Col. Grandes cientistas sociais).
[9] Ibidem.
[10] COHN, Gabriel. Introdução. In: Max Weber: sociologia. Gabriel Cohn (org.). São Paulo: Ática, 1999. (Col. Grandes cientistas sociais).
[11] LAKATOS, Eva Maria. Sociologia geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1979.
[12] Ibidem.
[13] Ibidem.
[14] COHN, Gabriel. Introdução. In: Max Weber: sociologia. Gabriel Cohn (org.). São Paulo: Ática, 1999. (Col. Grandes cientistas sociais).
[15] Ibidem.
[16] Cf. Ibidem.
[17] LAKATOS, Eva Maria. Sociologia geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1979.
[18] DAVIS, Kingsley. A sociedade humana. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1964.


Renato Padilha Ferreira Barros
É advogado e bacharel em Direito pela Faculdade Salesiana do Nordeste. É pós-graduado em Docência em Filosofia e Sociologia pelo INSAF - Instituto Salesiano de Filosofia. É graduado em Comunicação Social com Habilitação em Relações Públicas pela ESURP - Escola Superior de Relações Públicas.