**Formato padrão para artigos: Tamanho do texto: aproximadamente duas ou três laudas; Fonte: Arial ou Times New Roman; Tamanho da fonte: 12; Espaçamento: 1,5. Identificação: Enviar uma foto e um mini currículo (nome, curso(s) e instituição de ensino).
***Todos os artigos serão avaliados 'a priori' por professores do curso de Direito e 'a posteriori' publicados.
****Os artigos que forem publicados no blog não precisarão ter limites de páginas, sendo exigido o formato padrão dos artigos apenas para o jornal impresso.
quarta-feira, 31 de dezembro de 2014
terça-feira, 30 de dezembro de 2014
domingo, 23 de novembro de 2014
CÓDIGO DE ÉTICA DOS ÍNDIOS NORTE-AMERICANOS
Levante-se com o Sol
para orar.
Ore sozinho. Ore com
freqüência.
O GRANDE ESPÍRITO o
escutará, se você ao menos, falar!
Seja TOLERANTE com
aqueles que estão perdidos no caminho.
A ignorância, o
convencimento, a raiva, o ciúme e a avareza, originam-se de uma alma perdida.
Ore para que eles
reencontrem o caminho do Grande Espírito.
Procure conhecer-se,
por si mesmo.
Não permita que outros
façam seu caminho por você.
É sua estrada, e
somente sua!
Outros podem andar ao
seu lado, mas ninguém pode andar por você!
Trate os convidados em
seu lar com muita consideração.
Sirva-os com o melhor
alimento, a melhor cama e trate-os com respeito e honra.
Não tome o que não é
seu.
Seja de uma pessoa, da
comunidade, da natureza, ou da cultura.
Se não lhe foi dado,
não é seu!
Respeite todas as
coisas que foram colocadas sobre a Terra.
Sejam elas pessoas,
plantas ou animais.
RESPEITE os
pensamentos, desejos e palavras das pessoas.
Nunca interrompa os outros
nem os ridicularize, nem rudemente os imite.
Permita a cada pessoa
o direito da expressão pessoal.
Nunca fale dos outros
de uma maneira má.
A energia negativa que
você colocar para fora no Universo, voltará multiplicada para VOCÊ !
Todas as pessoas cometem
erros.
E todos os erros podem
ser perdoados!
Pensamentos maus
causam doenças da mente, do corpo e do espírito.
Pratique o OTIMISMO !
A NATUREZA não é para
nós, ela é uma parte de nós.
Toda a natureza faz
parte da nossa FAMÍLIA TERRENAL.
As CRIANÇAS são as
sementes do nosso futuro.
Plante amor nos seus
corações e regue com sabedoria e lições da vida.
Quando forem
crescidos, dê-lhes espaço para que continuem
CRESCENDO!
Evite machucar os
corações das pessoas. O veneno da dor
causada a outros,
retornará à você.
Seja sincero e
verdadeiro em todas as situações.
A honestidade é o
grande teste para a nossa herança do Universo.
Mantenha-se
equilibrado. Seu corpo Espiritual, seu corpo Mental, seu corpo Emocional e seu
corpo Físico, todos necessitam ser fortes, puros e saudáveis.
Trabalhe o seu corpo
Físico para fortalecer o seu corpo Mental.
Enriqueça o seu corpo
Espiritual para curar o seu corpo Emocional.
Tome decisões
conscientes de como você será e como reagirá.
Seja responsável por
suas próprias ações.
Respeite a privacidade
e o espaço pessoal dos outros.
Não toque as
propriedades pessoais de outras pessoas,
Especialmente objetos
religiosos e sagrados.
Isto é proibido.
Comece sendo
verdadeiro consigo mesmo.
Se você não puder
nutrir e ajudar a si mesmo, você não poderá nutrir e ajudar os outros.
Respeite outras
crenças religiosas.
Não force as suas
crenças sobre os outros.
Compartilhe sua boa
fortuna com os outros.
Participe com
caridade.
CONSELHO INDÍGENA INTER-TRIBAL NORTE AMERICANO
Deste conselho
participam as tribos: Cherokee Blackfoot, Cherokee,
Lumbee
Tribe, Comanche, Mohawk, Willow Cree, Plains Cree, Tuscarora, Sicangu Lakota
Sioux, Crow (Montana), Northern Cheyenne (Montana)
Fonte: http://josecarlosalexandre.blogspot.com.br/2012/09/codigo-de-etica-dos-indios-norte.html
sexta-feira, 31 de outubro de 2014
O DIREITO COMO OBJETO DA JUSTIÇA: A VISÃO JUSNATURALISTA DE TOMÁS DE AQUINO
O Direito e a Justiça sempre
foram questões discutidas nos diversos sistemas filosóficos e jurídicos ao
longo da história. No século IX, como
consequência do renascimento carolíngia, surgem várias escolas que cultivavam
certo saber filosófico e teológico e que proporcionavam consideráveis debates
jusnaturalisticos. Esse movimento intelectual produzido nas escolas e que uniu
a filosofia e a teologia foi chamado de Escolástica e teve como maior expoente
Tomás de Aquino (1225 – 1274). A escolástica pré-tomista ainda vivia direcionada
ao movimento platônico-agostiniano e ocupava-se em discutir os problemas da
época por um idealismo ontológico. No século XIII as questões filosóficas tomam
outro rumo. Há uma tentativa de introduzir o aristotelismo, principalmente nas
obras de Anselmo Magno (1193 ou 1206-7-1280), Bispo da Igreja Católica,
filósofo, teólogo e professor do Doctor
Angelicus. O quarto Concílio de Latrão combateu as heresias dos cátaros,
principalmente em relação à origem do mal, e deslocou o centro de gravidade do
problema para a questão histórico-ética, afirmando que o mal é um problema de
ordem moral. Com essas discussões, Tomás de Aquino rompe com o idealismo
ontológico platônico-agostiniano e, com o aristotelismo, direciona suas
especulações para o âmbito do realismo moderado. Nesse contexto, a Justiça não
é mais um fim, como um prêmio recebido após uma vida reta, justa e virtuosa,
mas um meio. Ela não se encontra na Cidade de Deus de Agostinho de Hipona, mas
na virtude aristotélica.
Para o
aquinate, a justiça tem a finalidade de orientar e retificar as ações humanas.
“Uma tal compreensão da justiça lhe confere o primeiro lugar na constelação das
virtudes, reconhecendo-lhe a dignidade de uma finalidade ou de um valor último,
ao qual se vincula o domínio das paixões como uma condição prévia e uma
exigência constante”. (AQUINO, 2005, p. 43). Tomás de Aquino discute a justiça
em volto a elementos essenciais para sua conjuntura, quais sejam: a alteridade
das pessoas, o direito estrito e a verdadeira igualdade, suscetível de ser
estabelecida segundo uma medida objetiva. Tais elementos formam o cerne do seu
jusnaturalismo, que desemboca na justiça distributiva e na justiça comutativa,
suas espécies.
O homem só
pode alcançar a virtude da justiça na relação com o outro, pois “a justiça não
tem a ver com um exercício do intelecto especulativo, puramente reflexivo; a
justiça é, pelo contrário, um hábito, portanto, uma prática, que atribui a cada
um o seu, à medida que cada um possui uma medida, e que nem todos são
materialmente iguais”. (BITTAR, 2010, p. 245). Essa concepção de ´dar a cada um
o seu´ é uma contribuição do direito romano. O que o aquinate faz é dizer qual
a medida de cada um. Essa medida, se for na justiça comutativa, que é a
responsável pelas relações particulares, terá uma projeção aritmética, numérica,
onde cada um terá que ter medidas iguais, levando-se em consideração as
igualdades e as desigualdades; se for na justiça distributiva, que tem a
responsabilidade da coordenação do relacionamento da parte com todo, terá uma
medida geométrica, distribuindo os bens e os cargos segundo o mérito, a
capacidade e a participação dentro da sociedade.
A virtude da justiça, que é a prática de dar a
cada um o que é seu na medida do seu
mérito, alcança sua finalidade quando distribui os bens de forma proporcional e
que atinja o meio termo. A virtude é o meio termo entre dois vícios. Esses
vícios são os atos injustos. Caso atribua um mérito a mais a uma pessoa, o ato
é injusto. Caso a atribuição meritocrática seja a menos, o ato também será
injusto. Dessa forma, a justiça é “um meio (médium) entre extremos opostos, ao
qual os gregos chamavam de mesotés,
ou seja, a justa medida entre algo por excesso e outro algo por carência”.
(BITTAR, 2002, p. 233).
Para que o
homem consiga adquirir o hábito da justiça será necessário um conjunto de
conhecimentos adquiridos a partir da experiência habitual. Tais conhecimentos
foram chamados de siderese. “É com
base nesses conhecimentos extraídos da vivência, da prática, que se podem cunhar
os principais conceitos acerca do que é bom e do que é mau, do que é justo e do
que é injusto”. (BITTAR, 2010, p. 151). Sabendo o que é bom ou mal, justo ou
injusto, o homem, pelo livre-arbítrio e pela razão prática, julga aquilo que é
certo ou errado e age, pela vontade, de forma consciente. O Estado não pode
penalizar as pessoas, utilizando-se da justiça corretiva, pelos atos injustos
praticados com fundamento na ignorância, pois o ato, dessa forma, não foi
injusto. O homem só pode ser punido (ou corrigido) se agir conscientemente.
Nesse contexto, o direito é o objeto da justiça porque é
o justo. “Ora, o justo é o objeto da justiça. [...] Todos concordam em dar o
nome de justiça ao hábitus que nos leva a praticar coisas justas”. (AQUINO,
2005, p. 46). Na concepção tomista o direito não está limitado à lei positiva,
mas a uma lei que legitima a lei escrita. Para o aquinate, o que legitima o
corpo normativo é a lei eterna, que é a lei que ordena tudo e que foi promulgada
por Deus. A racionalização dessa lei eterna é chamada de lei natural, enquanto
a sua revelação pela sagrada escritura é chamada de lei divina. A lei natural é
comum aos animais humanos e não humanos. A lei natural para os homens é o
direito das gentes. “A lei humana, por sua vez, é fruto de uma convenção; não
possui força por si só, mas adquire a partir do momento em que é instituída.
Representa, assim, a concretização da lei natural”. (BITTAR, 2010, p. 257). O
direito é o justo que legitima o ius
positum.
Para
que as pessoas vivam de forma justa, será necessário que o legislador, tendo
como parâmetro de criação da lei o justo natural, desenvolva regras
convencionais positivas que garantam uma vivência pacífica e que ordene e
retifique os homens em suas ações para que eles alcancem o Bem Comum e a eudaimonia, que é a felicidade. Essas
regras convencionais positivas garantirão uma vivência reta e obediente aos
princípios gerados pela lei eterna. Dessa forma, o Estado, representado no
âmbito jurisdicional pela autoridade do juiz, corrigirá as atitudes injustas,
com base na lei eterna, e restabelecerá a ordem e a paz social. O juiz,
procedendo de forma justa, legitimado pelo Estado e inspirado pela prudência,
sentenciará dando a cada um o que é seu conforme os seus méritos e deméritos. Dessa
forma, mesmo que uma pessoa saia da vida reta e pratique uma injustiça, o
Estado garantirá a devida correção para que todos alcancem a virtude da
justiça, que é a vontade constante e perpétua de dar a cada um o seu direito.
REFERÊNCIAS
AQUINO, São Tomás de. Suma Teológica. São Paulo: Loyola, 2005.
BITTAR, Eduardo C. B. Curso de filosofia do direito. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
____. Curso
de ética jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002.
É advogado e bacharel em Direito pela Faculdade Salesiana do Nordeste. É pós-graduado em Docência em Filosofia e Sociologia pelo INSAF - Instituto Salesiano de Filosofia. É graduado em Comunicação Social com Habilitação em Relações Públicas pela ESURP - Escola Superior de Relações Públicas.
quarta-feira, 29 de outubro de 2014
Ética e Justiça em Aristóteles - Por Fábio Luiz Antunes
Por Fábio Luiz Antunes
Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais
Resumo: A ética em
Aristóteles é voltada para a razão prático-teleológica, no sentido da busca de
todas as coisas por um bem, e sendo esta a busca também das ações humanas, este
deve ser o melhor dos bens, cuja finalidade encontra-se em si mesmo. Este bem
para o ser humano é a felicidade, que é atingida por meio da prática reiterada
de virtudes. A justiça nesse contexto é considerada como virtude, porém, a virtude
por excelência, visto que se manifesta diante do outro.
Palavras-chaves: Felicidade. Bem
Supremo. Teleologia. Ética. Racionalidade.
Abstract: The ethics in
Aristotle are come back toward the practical-teleologic reason, in the
direction of the search of all the things for a good, and being this the search
also of the actions human beings, this must be optimum of the goods, whose
purpose meets exactly in itself. This good it human being is the happiness,
that is reached by means of the practical one reiterated of virtues. The
justice in this context is considered as virtue, however, the virtue, since if
par excellence manifest ahead of the other.
Keywords: Happiness. Well
Supreme. Teleology. Ethics. Rationality
SUMÁRIO: Introdução.
1. VIDA E OBRA DE ARISTÓTELES. 2. Ética aristotélica. 3. Concepção de justiça.
3.1. Justiça universal e justiça particular. 3.2. Justiça distributiva e
justiça corretiva. 3.3. Justiça política e justiça doméstica. 3.4. Justiça
legal e justiça natural. 4. Equidade, o corretivo do justo legal. Considerações
finais. Referências bibliográficas
INTRODUÇÃO
A vida do homem grego, contemporâneo
de Aristóteles, se consistia na busca por seu thélos (finalidade),
que somente poderia ser alcançada por meio da prática reiterada das
virtudes, estas consistentes em um meio-termo entre dois extremos. A finalidade
da vida humana é o alcance do “bem supremo”, pois é a busca da realização da
concretude de sua forma, que é realizado por meio da qualidade que o difere dos
demais seres, isto é, a razão.
Este trabalho tem por escopo
apresentar a ética em Aristóteles, espelho do pensamento grego no séc. IV a.C.,
apresentando-a como fruto da razão prática, e considerando a justiça como
virtude, pois também se consiste em um justo meio entre extremos, dissecar seus
conceitos tal qual o fizera o Filósofo em sua época na Ética a Nicômaco.
1. VIDA E OBRA DE
ARISTÓTELES
Aristóteles nasceu em 384 a.C. em
Estagira, na Macedônia. Filho de médico, mudou-se para Atenas aos dezoito anos
de idade, onde se tornou discípulo na Academia de Platão. Mais tarde, com a
morte de seu mestre e por discordar do sucessor deste, Espeusipo, mudou-se para
Assos, na Ásia Menor.
Anos depois é chamado à corte de
Pela, e recebe um convite do Rei Filipe da Macedônia para ser o tutor de seu
filho Alexandre, o que foi aceito pelo Filósofo. Com a morte de Filipe, Alexandre
assume o trono da Macedônia e inicia sua expansão ao Oriente. Neste momento,
Aristóteles retorna à Atenas, e, próximo ao Apolo Liceano, funda a escola do
Liceu.
Aristóteles ministrava suas aulas no
Liceu caminhando, habito pelo qual ficou conhecido como peripatético(peripathós),
ou seja, o que caminha. Nessa academia, enfatizava o estudo das ciências
naturais, em especial, a biologia. Em suas expedições, Alexandre colhia
exemplares da fauna e da flora, e enviava ao seu ex-preceptor, para integrar e enriquecer
o acervo do Liceu.
Após a morte de Alexandre Magno,
Aristóteles se viu hostilizado pelos atenienses, sendo acusado de impiedade aos
deuses e politicamente suspeito pelas facções antimacedônicas. O Filósofo
então, “diferentemente de Sócrates, não foi filósofo bastante para esperar a
cicuta; fugiu para casa da sua mãe em Cálcida” (MORRIS, 2002, p. 5). Lá faleceu
um ano depois, de causa natural.
Sua obra se consiste basicamente em
duas espécies: as direcionadas ao povo e os escritos filosóficos, chamados deacroamáticas,
os quais ministrava aos alunos no Liceu. Das suas obras publicadas pouco
sobrou, e os tratados acroamáticos foram compilados por Andrônico, diretor da
escola peripatética no séc. I a.C., recebendo o nome deCorpus Aristotelicum.
Essa compilação continha, dentre outros livros, o Organon, que é o
conjunto de tratados aristotélicos sobre a lógica, e a Ética, onde
a principal obra integrante é a Ética à Nicômaco, que tem esse
título por ter sido editada por seu filho Nicômaco.
2. ÉTICA ARISTOTÉLICA
A ética em Aristóteles parte do
conceito de teleologia, no sentido de que todas as formas
existentes tendem a uma finalidade (thélos). Nessa linha, “toda ação e
todo propósito visam um bem”, entendendo-se por bem ”aquilo a
que todas as coisas visam”. (ARISTÓTELES, 1996, p.118)
Portanto, daí infere-se que as ações
humanas também são sempre voltadas, por meio da razão, a atingir um fim, que é
a busca pelo bem supremo (summum bonum). Essa busca, porém, se trata de
um bem que deve necessariamente ser considerado em si mesmo, pois, como explana
o Filósofo,
“se há, então, para as ações que
praticamos, alguma finalidade que desejamos por si mesma, sendo tudo mais
desejado por causa dela, e se não escolhemos tudo por causa de algo mais (se
fosse assim, o processo prosseguiria até o infinito, de tal forma que nosso
desejo seria vazio e vão), evidentemente tal finalidade deve ser o bem e o
melhor dos bens.” (ARISTÓTELES, 1996, p. 118)
Assim, constitui a vida humana na
busca de algo que está no humanamente possível, o que Aristóteles acredita ser
a felicidade (eudaimonia), pois, conforme doutrinado
por Bittar (2010), a noção de felicidade é criação humana, sendo plenamente
alcançável e obtida pela razão teleológica.
A razão é a faculdade que distingue
os seres humanos dos demais seres vivos. É por meio dela que o indivíduo se
guia teleologicamente, como forma de obter o bem supremo, ou seja, a eudaimonía.
A felicidade é “a atividade conforme
a excelência” (ARISTÓTELES, 1996, p. 128), e é esta “que torna o homem capaz de
praticar ações nobilitantes [...]” (ARISTÓTELES, 1996, p. 134). A excelência
por sua vez se classifica em excelência intelectual e excelência moral. Em seus
próprios dizeres:
“certas formas de excelência são
intelectuais e outras são morais (a sabedoria, a inteligência e o discernimento
são intelectuais, e a liberalidade e a moderação, por exemplo, são formas de
excelência moral).” (ARISTÓTELES, 1996, p. 136)
A excelência intelectual se deve
tanto o seu nascimento quanto o seu crescimento à instrução (experiência e
tempo), enquanto à excelência moral é produto do hábito (ethós). Logo,
ninguém é virtuoso por natureza, pois isso é fruto de práticas reiteradas de
ações moralmente boas e do conseqüente desenvolvimento de uma disposição da
alma para o agir excelente, e não do aprimoramento das habilidades naturais.
A razão teleológica é que permite ao
ser humano guiar-se pelos caminhos do meio, que se encontra entre dois
extremos, o do excesso e o da falta, considerados pelo Filósofo como
deficiências morais. De maneira eqüidistante entre os extremos se encontram as
virtudes (areté). Cabe à razão discernir e optar pelo meio-termo de
forma habitual, que cuja prática contínua e reiterada das virtudes leva à
excelência moral, e por conseguinte, se atinge a felicidade.
A justiça, no pensamento
aristotélico, é compreendida como uma virtude, e como tal, localiza-se no
meio-termo (mesotés). Ela se difere das demais virtudes e se coloca em
posição superior por ser uma virtude que manifesta na aplicação da excelência
moral em relação às outras pessoas, não em relação a si mesmo.
3. CONCEPÇÃO DE
JUSTIÇA
O Filósofo, no Livro V da Ética a
Nicômaco, trata da dikayosyne (justiça) e da aidikía (injustiça),
dizendo que nas pessoas, a primeira é a “disposição da alma que graças à qual
elas dispõem a fazer o que é justo, a agir justamente e a desejar o que é
justo; de maneira idêntica, diz-se que a injustiça é a disposição da alma de
graças à qual elas agem injustamente e desejam o que é injusto”. (ARISTÓTELES,
1996, p. 193)
Introdutoriamente, considerando a
justiça e a injustiça, indaga, pretendendo demonstrar sobre “quais são as
espécies de ações com as quais elas se relacionam, que espécie de meio-termo é
a justiça, e entre que extremos o ato justo é o meio-termo” (ARISTÓTELES, 1996,
p. 193).
A justiça, conforme dito alhures, é
considerada como a maior das virtudes, pois esta visa o “bem do outro”,
relacionando-se com o próximo. Aristóteles, citando as Elegias de
Têognis, diz que “nem a estrela vespertina nem a matutina é tão maravilhosa
(...); na justiça se resume toda excelência” (ARISTÓTELES, 1996, p. 195).
Nas palavras de Aristóteles:
“A justiça é a forma perfeita de
excelência moral porque ela é a prática efetiva da excelência moral perfeita.
Ela é perfeita porque as pessoas que possuem o sentimento de justiça podem
praticá-la não somente a sim mesmas como também em relação ao próximo.”
(ARISTÓTELES, 1996, p. 195).
A ação justa se é reconhecida pelo
seu contrário, ou seja, pela ação injusta, pois, “muitas das vezes se reconhece
uma disposição da alma graças a outra contrária, e muitas vezes as disposições
são idênticas por via das pessoas nas quais elas se manifestam”. (ARISTÓTELES,
1996, p. 193).
Assim, de forma ampla, Aristóteles
divide a justiça em duas classes: a justiça universal e a justiça particular.
3.1. Justiça
Universal e Justiça Particular
Pela analogia dos contrários, Aristóteles
conclui que
“o termo injusto se
aplica tanto às pessoas que infringem a lei quanto às pessoas ambiciosas (no
sentido de quererem mais do que aquilo a que têm direito) e iníquas, de tal
forma que as cumpridoras da lei e as pessoas corretas serão justas. O justo,
então, é aquilo conforme à lei e correto, e o injusto é o ilegal e iníquo.”
(ARISTÓTELES, 1996, p. 194)
Daí se extrai o conceito de justo
universal, pois este é o cidadão cumpridor da lei. Trata-se de uma obediência
aonómos, ou seja, ao ordenamento jurídico expresso pelas normas,
englobando também os costumes e princípios preponderantes em uma determinada
comunidade.
Como magistralmente explica Bittar
(2010),
“se a lei (nómos) é uma
prescrição de caráter genérico e que a todos vincula, então seu fim é a
realização do Bem da comunidade, e, como tal, do Bem Comum. A ação que se
vincula à legalidade obedece a uma norma que a todos e para todos é dirigida;
como tal, essa ação deve corresponder a um justo legal e a forma de justiça que
lhe é por conseqüência é a aqui chamada justiça legal” (BITTAR, 2010, p. 130)
Explica ainda o supramencionado autor
que esse é o conceito de justiça em sentido amplo, o qual, de todos os sentidos
é o mais genérico, daí ser também denominado de justiça total ou integral, haja
vista que tem aplicação mais abrangente e extensa, pois “as leis valem para o
bem de todos, para o bem comum”. (BITTAR, 2010, p. 130)
A justiça particular é uma
espécie de justiça que, ao contrário do que ocorre com a justiça universal (díkaion
nominon), se corresponde a apenas uma parte da virtude e não à virtude
total (BITTAR, 2010, p. 132). Portanto, o justo particular é espécie do gênero
justo total.
Divide-se em duas espécies, a saber,
justiça distributiva e justiça corretiva.
3.2. Justiça Distributiva
e Justiça Corretiva
A justiça distributiva é a que se
observa na distribuição pela polis, isto é, pelo Estado, de bens,
honrarias, cargos, assim como responsabilidades, deveres e impostos (BITTAR,
2010, p. 133). Conforme dito pelo próprio Filósofo, na Ética:
“Uma das espécies de justiça em
sentido estrito e do que é justo na acepção que lhe corresponde, é a que se
manifesta na distribuição de funções elevadas de governo, ou de dinheiro, ou
das outras coisas que devem ser divididas entre os cidadãos que compartilham
dos benefícios outorgados pela constituição da cidade, pois em tais coisas uma
pessoa pode ter participação desigual ou igual à de outra pessoa.”
(ARISTÓTELES, 1996, p. 197)
Nessa perspectiva, conforme
doutrinado por Bittar (2010) o injusto seria o desigual quando há o recebimento
de benefícios e encargos em quantia menor ou maior ao que lhe é devido.
“O justo nesta acepção é, portanto o
proporcional, e o injusto é o que viola a proporcionalidade. Neste último caso,
um quinhão se torna muito grande e outro muito pequeno, como realmente acontece
na prática, pois a pessoa que age injustamente fica com um quinhão muito grande
do que é bom e a pessoa que é tratada injustamente fica com um quinhão muito
pequeno. No caso do mal o inverso é verdadeiro, pois o mal maior, já que o mal
menor deve ser escolhido em preferência ao maior, e o que é digno de escolha é
um bem, e o que é mais digno de escolha é um bem ainda maior.” (ARISTÓTELES,
1996, p. 199).
Em suma, a justiça distributiva é um
meio termo com quatro termos na relação: dois sujeitos comparados entre si e
dois objetos. Será justo, portanto se atingir a finalidade de dar a cada um
aquilo que lhe é devido, na medida de seus méritos.
A justiça corretiva se
difere da distributiva no sentido de que esta utiliza como critério de justa
repartição aos indivíduos os méritos de cada um, enquanto aquela visa o
“restabelecimento do equilíbrio rompido entre os particulares: a igualdade
aritmética.” (BITTAR, 2010, p. 135).
Conforme os ensinamentos do Filósofo,
a justiça corretiva
“é a que desempenha função corretiva
nas relações entre as pessoas. Esta última se subdivide em duas: algumas
relações são voluntárias e outras são involuntárias; são voluntárias a venda, a
compra, o empréstimo a juros, o penhor, o empréstimo sem juros, o depósito e a
locação (estas relações são chamadas voluntárias porque sua origem é
voluntária); das involuntárias, algumas são sub-reptícias (como o furto, o
adultério, o envenamento, o lenocínio, o desvio de escravos, o assassino
traiçoeiro, o falso testmunho), e outras são violentas, como o assalto, a
prisão, o homicídio, o roubo, a mutilação, a injúria e o ultraje.”
(ARISTÓTELES, 1996, p. 197).
A aplicação da justiça corretiva fica
ao encargo do juiz (dikastés), que é o mediador de todo o processo. O
juiz é considerado para Aristóteles, a personificação da justiça, pois, “ir ao
juiz é ir à justiça, porque se quer que o juiz seja como se fosse a própria
justiça viva (...) é uma pessoa eqüidistante e, em algumas
cidades são chamados de ‘mediadores’, no pressuposto de que, se as pessoas
obtêm o meio-termo, elas obtêm o que é justo.” (ARISTÓTELES, 1996, p. 200).
3.3. Justiça
Política e Justiça Doméstica
A justiça política se dá no âmbito
das relações dos indivíduos na polis, pertinente ao status
civitatis do cidadão perante seus iguais. Bittar (2010) explica que
“existente no meio social, é a justiça que organiza um modo de vida que tende à
autossuficiência da vida comunitária (autárkeian), vigente entre homens
que partilham de um espaço comum” (BITTAR, 2010, p. 140).
Conforme se extrai dos escritos de
Aristóteles, o justo político
“se apresenta entre as pessoas que
vivem juntas com o objetivo de assegurar a auto-suficiência do grupo – pessoas
livres e proporcionalmente ou aritmeticamente iguais. Logo, entre pessoas que
não se enquadram nesta condição não há justiça política, e sim a justiça em um
sentido especial e por analogia.” (ARISTÓTELES, 1996, p. 205).
Portanto, as pessoas consideradas
cidadãs na polis na época de Aristóteles formavam um conjunto
restrito e excludente (pois se excluem deste conjunto os estrangeiros,
mulheres, escravos, menores e aqueles que não são livres), não se aplicando a
justiça política sobre os demais membros, atingindo-os apenas obliquamente.
A justiça doméstica é a que se
encontra no âmbito da casa, no que se refere ao filho, escravos e a mulher.
Assim, “pode-se dizer que a justiça doméstica tem estas últimas como espécies
(justiça para com a mulher; justiça para com os filhos; justiça para com os
escravos).” (BITTAR, 2010, p. 142).
Aristóteles sustenta que
“a justiça do senhor para com o
escravo e a do pai para com o filho não são iguais à justiça política, embora
se lhe assemelhem; na realidade, não pode haver injustiça no sentido irrestrito
em relação a coisas que nos pertencem, mas os escravos de um homem, e seus
filhos até uma certa idade em que se tornam independentes, são por assim dizer
partes deste homem, e ninguém faz mal a si mesmo (por esta razão uma pessoa não
pode ser injusta em relação a si mesma)”. (ARISTÓTELES, 1996, p. 205)
Portanto, não há que se falar em
justiça ou injustiça nesses casos, pois ninguém é capaz de fazer mal a si, como
justifica Aristóteles o poder irrestrito do pai e senhor sobre seu filho e seu
escravo.
3.4. Justiça Legal
e Justiça Natural
A justiça legal e a justiça natural
são divisões do gênero que é a justiça política. Bittar (2010) explica a
distinção aristotélica entre o justo legal (díkaion nomikón) e o justo
natural (díkaion physikón) no sentido de que aquele corresponde às
prescrições derivadas do nómos, isto é, das regras vigentes entre
os cidadãos políticos, e este, encontra fundamento na própria natureza. É assim
a distinção feita por Aristóteles:
“A justiça política é em parte natural
e em parte legal; são naturais as coisas que em todos os lugares têm a mesma
força e não dependem de as aceitarmos ou não, e é legal aquilo que a princípio
pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra, mas depois de
determinado já não é indiferente.” (ARISTÓTELES, 1996, p. 206).
A justiça legal tem fundamento na
lei, que é definida pela vontade do legislador. Possui força não natural, e é
fundada na convenção, pois a vontade do órgão que emana o ato legislativo é
soberana e pressupõe consenso de todos os súditos; uma vez vigente a lei
adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadãos.
A justiça natural, entretanto se
consiste no
“conjunto de todas as regras que
encontram aplicação, validade, força e aceitação universais. Assim pode-se
definir o justo natural como sendo parte do justo político que encontra
respaldo na natureza humana, e não depende do arbítrio volitivo do legislador,
sendo por conseqüência, de caráter universalista.” (BITTAR, 2010, p. 145).
Portanto, a justiça natural tem uma
força que rompe com as barreiras políticas, sendo que transcende a vontade
humana e são imutáveis, e tem a mesma forma em todo lugar, “como o fogo que
queima aqui e na Pérsia” (ARISTÓTELES, 1996, p. 206).
4. EQÜIDADE, O
CORRETIVO DO JUSTO LEGAL
Ao tratar da eqüidade, Aristóteles a
compara com justiça, e conclui que são “a mesma coisa, embora a eqüidade seja
melhor. O que cria o problema é o fato de o eqüitativo ser justo, mas não justo
segundo a lei, e sim um corretivo da justiça legal”. (ARISTÓTELES, 1996, p.
212)
Na impossibilidade de previsão pelo
legislador de todos os casos que poderão surgir na realidade, o aplicador das
leis deve se ater às peculiaridades do fato concreto, “dizendo o que o próprio
legislador se estivesse presente, e o que teria incluído em sua lei se houvesse
previsto o caso em questão” (ARISTÓTELES, 1996, p. 213).
O eqüitativo é, pois, a correção da
lei quando esta é omissa em virtude de sua generalidade. De forma ilustrativa,
Aristóteles a compara à régua de Lesbos, que se molda à forma da pedra devido a
sua maleabilidade.
“Com efeito, quando uma situação é
indefinida a regra também tem de ser indefinida, como acontece com a régua de
chumbo usada pelos construtores em Lesbos; a régua se adapta à forma da pedra e
não é rígida, e o decreto se adapta aos fatos de maneira idêntica.”
(ARISTÓTELES, 1996, p. 213)
A equidade, portanto, é a adequação
da lei ao caso concreto, atendidas suas peculiaridades, tendo em vista o
caráter genérico e abstrato da atividade do legislador, atribuindo ao juiz a
ponderação proporcional da norma à situação fática.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
A obra de Aristóteles voltada para o
Estudo da ética centra-se na razão prática como responsável pela realização da
forma plena humana, pois, é por meio de reiteradas práticas virtuosas – que se
consistem em um meio-termo entre dois extremos – que se atinge a felicidade (eudaimonía),
o summum bonum buscado pelas ações humanas, isto é, de todos
os bens o maior, cuja finalidade encontra-se em si mesma.
A felicidade, por se tratar de
conceito humano, está no plenamente possível, sendo que se é atingida por meio
da escolha consciente das virtudes, como oposição entre seus extremos.
A justiça se localiza na seara das
virtudes, porém, em posição de destaque visto que é a virtude que se manifesta
ao lidar com o outro, e não consigo mesmo (onde Aristóteles afirma não ser
possível alguém cometer injustiça contra si mesmo). É o bem do outro, e também
é o meio-termo entre dois extremos: o do excesso e o da falta.
Sendo assim, justiça é aquela
disposição da alma de dar a cada um o que é seu, na medida de seus méritos,
obedecendo ao nómos político, não se apropriando de nada mais
e nada menos daquilo que lhe é devido.
Referências bibliográficas:
ARISTÓTELES. Ética à Nicômaco. São
Paulo. Nova Cultural: 1996.
BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Curso
de filosofia do direito. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
MORRIS, Clarence. Grandes
filósofos do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
Fonte: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=962 8&revista_caderno=15
Assinar:
Postagens (Atom)