No último dia 24 (outubro) fez-se 40 anos desde a morte de Josué de Castro, o recifense que escolheu como objeto de estudo a fome. Desde que se formou em Medicina, na Universidade do Rio de Janeiro, em 1929, Josué de Castro entendeu que a fome é um fenômeno complexo.
Sara Brito
Uma equação que é influenciada por vários fatores e que afetava grande parte da população brasileira e mundial. Josué de Castro pensou e refletiu sobre temas de variadas áreas, como o meio ambiente, a paz e o subdesenvolvimento. Ele acreditava na multidisciplinaridade do trabalho científico. Mas dedicou a maior parte de seus esforços ao problema da fome e da miséria.
Um problema que ainda hoje é um dos maiores que a humanidade enfrenta. Segundo relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) em 2012, 925 milhões de pessoas de todo o mundo não comem o suficiente para serem consideradas saudáveis. A fome é a campeã na lista dos dez maiores riscos para a saúde. Ela mata mais pessoas por ano do que a AIDS, a malária e a tuberculose juntas. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS).
Esse enorme problema que ainda hoje mata milhares de pessoas, Josué de Castro já era de que só se resolveria quando os esforços se fizerem efetivos em diversos campos. “É o ideário do Desenvolvimento Humano Sustentável que, segundo ele, implica em mudanças sociais alinhadas às transformações tecnológicas, mas com respeito aos princípios ecológicos e geográficos. Deve-se entender o desenvolvimento como uma combinação de transformações quantitativas e qualitativas,” explica Pedro Israel, professor do Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco e seguidor da linha de pesquisa de Josué de Castro.
O pensamento visionário de Josué o levou a se tornar presidente do Conselho Executivo da FAO, entre 1952 a 1956. Nesse cargo ele idealizou uma “reserva internacional contra a fome”, para ajudar países em situação emergencial. Por suas obras e pelo seu incansável combate à fome mundial, recebeu, em 1954, o Prêmio Internacional da Paz e foi indicado mais de uma vez ao Prêmio Nobel da Paz. O golpe militar de 1964, cassou seus direitos políticos ele ficou exilado em Paris, na França, onde morreu, em 1973, sem nunca ter retornado em vida ao seu país.
Fome é fruto da ação humana - Josué de Castro pensava na fome como um flagelo não-natural, “fabricado pelos homens, contra outros homens”, dizia ele. Sua opinião era de que a fome independe de fatos da natureza; ela é fruto das ações e escolhas dos seres humanos e da condução econômica que eles dão ao ambiente em que vivem. A comunidade internacional se surpreendeu e o aplaudiu por esses e outros pensamentos publicados, em 1946, em seu festejado livro “Geografia da Fome”. Nele Josué analisava hábitos alimentares de diferentes grupos humanos e tentava descobrir as causas naturais e sociais que os levavam a tais hábitos.
Josué de Castro acreditava que a estrutura de produção latifundiária e de monocultivo não condizia com a busca pela segurança e soberania alimentar, muito menos com o conceito de Desenvolvimento Humano Sustentável. Em suas próprias palavras, no “Geografia da Fome”: “Nenhum fator é mais negativo para a situação de abastecimento alimentar do país do que a sua estrutura agrária feudal, com um regime inadequado de propriedade, com relações de trabalho socialmente superadas e com a não utilização da riqueza potencial dos solos.”
Assim, acreditava piamente na qualidade que a agricultura familiar e a Reforma Agrária poderiam trazer para a vida das pessoas. Defendia que a agricultura familiar seria a melhor forma de manter o homem no campo e de possibilitar a sua alimentação. “Mesmo com os avanços tecnológicos na agricultura que resultaram em crescimento das nações, incluindo o Brasil, não ocorreu o correspondente desenvolvimento social equilibrado, pelo contrário, nos distanciamos da solução do problema, com favorecimento ao agronegócio,” afirma o professor Pedro Israel.
Incentivar o desenvolvimento da agricultura familiar, fez parte das defesas de Josué de Castro: “a intensificação do cultivo de alimentos sob a forma de policultura nas pequenas propriedades, realizada de forma sustentável e garantindo a fixação do homem ao campo”.
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